Jornal A Redação: “O meio ambiente vai entrar na era digital”, afirma Andréa Vulcanis
A nova secretária de Meio Ambiente de Goiás, Andréa Vulcanis, afirma que a atual Secima – que será transformada em Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) após a reforma administrativa – entrará na "era digital", referindo-se ao processo de digitalização que será implantado no órgão.
Em entrevista exclusiva ao jornal A Redação, nesta segunda-feira (14/1), ela revelou a intenção de eliminar a burocracia, padronizar e agilizar processos de licencimento ambiental, visto que a concessão de licenças, para determinados empreendimentos, pode levar até 12 anos. Desta forma, segundo ela, será possível criar uma agenda positiva e implementar projetos estruturantes, como em relação à geração de energias renováveis, gestão de resíduos sólidos, entre outros.
Outra prioridade, de acordo com Andréa, será cumprir o que estabelece o Código Florestal. Dados alarmantes mostram que Goiás tem um significativo passivo ambiental: do total de 98% das propriedades rurais inscritas no Cadastro Ambiental Rural (CAR), foi analisado um universo de 15% , resultando na constatação de 85% de passivo ambiental, ou seja, áreas onde a reserva legal foi desmatada.
Andréa promete apresentar medidas para que esse número seja solucionado em curto, médio e longo prazo. A superpasta será desmembrada em dois novos órgão: a Semad e a Secretaria de Infraestrutura e Cidades. A nova secretária é paranaense e tem 22 anos de experiência na área ambiental, com foco no desenvolvimento de políticas de gestão ambiental.
A Redação – Quais são as suas primeiras ações à frente da atual Secima? Está fazendo um raio-X da pasta?
Andréa Vulcanis– Estamos fazendo primeiro um diagnóstico. O levantamento de dados já foi feito. A gente fez um questionário por área, uns têm 50, outros têm 30 quesitos. Muita informação chegou na última semana. Na verdade, as gerências da área ambiental estavam com servidores de carreira. Mesmo estando exonerados, conseguimos aproveitá-los. Passamos pelo diagnóstico do licenciamento, dos recursos hídricos, de fauna, flora, educação ambiental, dos conselhos, educação ambiental. A gente recebeu mais de 15 questionários e estamos compilando esses dados.O governador [Ronaldo Caiado] pediu para que a gente fizesse um diagnóstico financeiro dos contratos e um diagnóstico da área finalística e a gente deve levar mais uns 10 dias para preparar isso e apresentar um relatório inicial da fotografia da secretaria. Do financeiro já foi feito, porque é simples. Hoje a gente tem uma dívida do final do ano passado de R$ 1,3 milhão basicamente para fornecedores, de manutenção. Hoje a Secretaria está gastando esse valor por mês só para manutenção básica ( água, luz, telefone, etc).
A Redação- Já é possível dizer quais contratos serão mantidos e quais serão suspensos?
Andréa Vulcanis – O primeiro olhar que a gente fez é o seguinte. Esses contratos estão no básico, não tem nada de excesso. Eu mesma olhei a lista. Agora tem que fazer um pente fino e abrir contrato por contrato e ver onde é possível cortar.
A Redação – Qual a sua análise em relação ao funcionamento da máquina administrativa. Como é possível eliminar a burocracia e agilizar processos?
Andréa Vulcanis – Todo nosso processo ali vai ser de tecnologia. A gente vai sair da era analógica e passar pra era digital. A Secretaria ainda é muito no papel, coisas analisadas sem um sistema, uma base de informação, que consolide as informações que são analisadas. Então, o movimento nosso todo agora se dá em duas fases: abrir as normas e o funcionamento operacional tirando tudo aquilo que seja excesso e transformando isso tudo em base de informação digital para que a gente tenha uma análise quanto mais informatizada, mais direta possível para reduzir a análise subjetiva no papel, dado por dado. Como a gente tá sem recurso, vai ter que fazer uma captação de recurso externo pra poder estruturar. A gente vai ter que chamar uma consultoria de elite, que já passou por reestruturações e tudo mais e construir uma agenda que seja da reformulação normativa que passa desde resoluções do conselho, portarias até eventualmente decretos e leis que a gente vai precisar mexer. Esse é um nível de estratégia para limpar essa burocracia. Vou dar um exemplo. Licenciamento ambiental. Como é que se define se um empreendimento precisa de um EIA/RIMA ou se precisa de um estudo mais simplificado? Hoje isso é uma análise muito subjetiva. Então, a gente parte agora pra critérios objetivos pra que essa definição se dê de forma prévia. Então, você já elimina fases de análise que levam a dois, quatro meses de espera.
(Foto: Letícia Coqueiro/A Redação)
A Redação – Até quanto tempo pode levar hoje a concessão de uma licença ambiental pela Secima?
Andréa Vulcanis – Tem informações de processos que estão demorando e os diagnósticos mostraram que não tem uma uniformidade, um padrão. Vamos adotar padrões pré-estabelecidos para tudo. Desde padrões normativos que estruturam procedimento, tirando todas as arestas até padrões tipicamente ambientais, com normas técnicas. Quando eu vou impactar uma fauna silvestre, qual é o padrão de impacto que eu vou estabelecer ali, como ele vai ser mitigado. Hoje eu peço, o empreendedor me informa como vai fazer, eu analiso para ver se tá bom, se tá ruim. A gente vai antecipar um padrão ambiental para todos os parâmetros ambientais. Isso agiliza toda a análise.
A Redação – Será preciso fazer um processo de licitação para implantar esse novo sistema de informatização?
Andréa Vulcanis – Para o sistema a gente já tem uma estrutura interna, tem um contrato em operação de desenvolvimento de sistema. Claro que vai precisar renovar contrato. Já tem uma equipe suficiente de desenvolvimento, mas para a parte de estruturação técnica, normativa aí vamos precisar trazer recursos de fora.
A Redação – Como a senhora pretende tratar o clássico dilema entre desenvolvimento econômico e desenvolvimento sustentável em Goiás?
Andréa Vulcanis – Aqui, quanto à questão rural, acho que a gente já passou do momento de ficar nesse embate. A situação de Goiás, do ponto de vista da ocupação do território, já está consolidada. É diferente do governo federal, que tem muita área de ampliação que tem desmatamento ilegal. O próximo passo é a aplicação do Código Florestal, que foi discutido amplamente em nível nacional por vários anos e definiu regras para as propriedades rurais que têm que cumprir a lei como qualquer outro tipo de atividade. Hoje a gente tem dados para isso. Noventa e oito por cento dos imóveis rurais já estão no Cadastro Ambiental Rural. É um número bastante grande para um estado ruralista. Entendo que as propriedades rurais deram seu primeiro passo exigido na lei, que era o cadastro. A partir de agora, iniciou-se uma análise desses cadastros. Desses 98% de imóveis, 15% já foram analisados. Desses 15%, em 85% foi detectado passivo ambiental, ou seja, não têm área de preservação permanente ou reserva legal. É muito. Como vamos fazer esses proprietários agora cumprir esse Código Florestal? Temos que solucionar esse passivo e vamos ter que escalonar em tempo, definir uma meta de curto, médio e longo prazo. Algumas iniciativas são importantes como, por exemplo, a regularização fundiária das unidades de conservação.
A Redação – Nos últimos três anos, Goiás tem enfrentado uma crise hídrica no período da seca, que afeta o abastecimento da população da Grande Goiânia e secou o Rio Meia Ponte. Como resolver esse problema?
Andréa Vulcanis – Nós temos um conjunto de ações que precisam estar integradas. A fiscalização, que é uma ação de curto prazo, que ocorreu no último ano, permitiu que em 2018 isso já estivesse menos problemático, e continua. Neste momento, as equipes estão elaborando planos de ação para contenção de emergência e crise hídrica. O pessoal da área de Recursos Hídricos já está fazendo um planejamento a partir da situação climática. Há indicativos que vamos ter uma realidade climática parecida com a do ano passado, em termos de precipitação. A partir disso, se estabelece um plano de emergência. Eu pedi para que a gente tenha isso pronto pra fevereiro porque se for necessário um decreto para reduzir as vazões outorgadas, a gente precisa soltar isso até início de março. Até para que todo o setor produtivo se prepare. Os irrigantes já diminuem área de produção e todo mundo se prepara para enfrentamento. A partir daí,a gente tem que se preparar para os próximos anos.
A Redação – Goiás tem o Programa Produtor de Água, que remunera os produtores rurais que preservam nascentes em suas propriedades. Como está essa iniciativa?
Andréa Vulcanis – Tem um programa desse, mas ele não está em todas as bacias e a gente vai ter que aumentar esse tipo de iniciativa exatamente porque o produtor de água é isso. Quando você recupera o solo do Entorno, a mata ciliar, aquela água fica ali onde ela tem que ficar, ela não vai embora quando chove. Esse é um programa que tem que ser incentivado. A recuperação das áreas adjacentes. Exatamente aí que a gente precisa começar a combater o passivo ambiental.
(Foto: Letícia Coqueiro/A Redação)
A Redação – Na semana passada, o governador Ronaldo Caiado afirmou que servidores estariam cobrando propina para emitir licenças ambientais. A senhora já tomou conhecimento disso?
Andréa Vulcanis – A secretaria vai trabalhar com ampliação de dados e transparência. Então, vai estar tudo informatizado, todos os dados abertos. Hoje se você abre o site da Secretaria você consegue muito pouca informação. As informações não estão tão transparentes quanto deveriam. A nossa iniciativa pra resolver é dar transparência aos processos, todos estarão dispostos para a sociedade conhecer. A gente precisa ter o controle social. É uma medida muito prioritária para que todas essas conversas e suspeitas possam ser sanadas. Eu não recebi nenhum tipo de denúncia. Hoje a gente tem um quadro de servidores de carreira atuando nas gerências. A princípio, foram todos reconduzidos para não haver solução de continuidade e vamos analisar com base em metas, cronogramas e resultados. Aqueles que atenderem, serão mantidos, quem não conseguir se adequar, será substituído.
A Redação – Como ficará a administração dos parques ecológicos em Goiás? Existe possibilidade da terceirização da gestão das unidades?
Andréa Vulcanis – A gente não terceiriza a gestão de parques, a gente terceiriza a área de uso público, onde o público pode acessar para o ecoturismo e educação ambiental. Primeiro, é preciso avaliar uma viabilidade econômica. Não adianta colocar uma empresa para gerir um turismo que tenha visitação de seis, sete turistas que nenhuma empresa vai aceitar fazer um investimento para o qual não vai ter retorno depois. Então, é preciso se avaliar, saber quais são os serviços que podem ser oferecidos, abrir a possibilidade de ampliação desse turismo para que a população de Goiás e de outros estados possa ter acesso. A partir disso, se fazem concessões para que essas áreas, mediante licitação, possam ser assumidas por terceiros. A gente tem intenção sim de fazer isso. Isso é muito importante não só para a unidade de conservação, mas para que a população se aproxime do meio ambiente de uma forma qualificada e também para os municípios do entorno e desenvolvimento sustentável do entorno. É algo que pode gerar muita renda mas precisa ser bem estruturado. Você pode ter trade turístico, hotéis, pousadas, tem que ser um grande projeto para ter viabilidade econômica.
A Redação – Quais medidas podem ser adotadas para garantir a preservação ambiental do Rio Araguaia?
Andréa Vulcanis – O Rio Araguaia é um rio federal. Então, a gente não tem atuação direta sobre ele, é uma atuação da União. Mas a grande questão ali são as áreas do entorno do rio que têm algumas ocupações que não são adequadas. A gente precisa fazer um grande diagnóstico quais atividades estão causando a degradação e, a partir disso, temos que sentar com as partes, o estado do Mato Grosso, de Goiás e a União e fazer uma ação conjunta para a revitalização. Naquilo que o Estado de Goiás puder fazer sozinho, fará. Naquilo que pudermos fazer em conjunto, nós vamos sentar e avaliar.