A importância do apoio psicológico para quem vive com HIV

Acolher o paciente oferecendo a ele cuidado e atendimento humanizado é um dos princípios norteadores do Instituto Sócrates Guanaes (ISG), organização social gestora do Hospital de Doenças Tropicais HDT desde junho de 2012.

Psicólogos do HDT lidam com angústias de pacientes que enfrentam preconceitos com a doença que um dia foi considerada sentença de morte

Acolher o paciente oferecendo a ele cuidado e atendimento humanizado é um dos princípios norteadores do Instituto Sócrates Guanaes (ISG), organização social gestora do Hospital de Doenças Tropicais HDT desde junho de 2012. A humanização no serviço prestado às pessoas que vivem e convivem com o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) é característica primordial da gestão, que trabalha diariamente para promover assistência de qualidade aos pacientes, preocupando-se não somente com o reestabelecimento da saúde, mas também com o equilíbrio social, biológico e psicológico.

Uma das principais barreiras enfrentadas por pessoas vivendo com o HIV é a revolta e a dificuldade de aceitação do diagnóstico. Isso ocorre porque o desconhecimento, gerador do preconceito, é um dos principais fatores de exclusão social da Pessoa Vivendo com HIV (PVHA). Temendo represálias, muitos portadores de HIV não se sentem à vontade de contar sobre a doença sequer à própria família. A informação é o principal caminho para desmistificar os “medos” pré-estabelecidos na sociedade e que, muitas vezes, não correspondem à realidade da condição de PVHA.

Para ajudar os pacientes HIV positivo e suas famílias a vencerem esses medos, o apoio psicológico é essencial. O trabalho realizado pelos profissionais da Psicologia dentro do HDT, referência no tratamento de doenças infectocontagiosas, é indispensável. “Com o adoecer físico, a internação, o diagnóstico impactante e muitas vezes também o isolamento, a pessoa soropositiva pode ser afetada emocionalmente também. O acompanhamento dos pacientes que correspondem ao perfil do HDT é fundamental e o objetivo é que consigamos reduzir o sofrimento psíquico e que eles não abandonem o tratamento”, esclarece Luciana Mendonça de Carvalho, psicóloga que faz parte da equipe multidisciplinar do hospital.

Aderir corretamente ao tratamento é indispensável para reverter o quadro clínico do paciente que possui HIV. “Hoje, em virtude do tratamento antirretroviral, o paciente praticamente não tem problemas físicos. É possível melhorar a qualidade de vida e da saúde de forma geral, além de diminuir o risco de transmissão do vírus. A maior dificuldade é na parte de discriminação e aceitação social”, explica a infectologista Christiane Kobal. Ainda segundo ela, a maioria das pessoas contaminadas adere ao tratamento corretamente e pelos exames são constatados bons resultados.

“Foi com o psicólogo que descobri que o remédio era para a vida toda, mas que tomando certo eu poderia ter uma vida normal. Eu pensava que mesmo tomando o medicamento poderia ter recaídas, mas descobri que vou ser mais forte e poder trabalhar. Mas tem hora que nada ajuda”, reflete S.A., marceneiro de 43 anos, HIV positivo, internado no HDT. “Há pacientes que conseguem lidar bem, apesar do impacto inicial, compreendendo a necessidade do tratamento, porém tem pacientes que por uma estrutura emocional frágil, não conseguem enfrentar tão bem, veem isso como uma sentença de morte”, explica a psicóloga.

Ao lidar diariamente com dezenas de pessoas de diferentes origens, a equipe de Psicologia do hospital cria diferentes formas de abordagem, sempre com o pressuposto de que o paciente conseguirá aderir ao tratamento. O resgate da autoestima é uma das questões trabalhadas pelos psicólogos, já que a falta dela é um sinal comumente evidenciado entre os pacientes. Além disso, a percepção negativa do próprio corpo; dificuldade de se olhar no espelho; fuga de contatos sociais por medo de rejeição; ansiedade generalizada; medo da morte; raiva; e também depressão são alguns dos sentimentos que afligem as pessoas que se descobrem infectadas pelo HIV. “As técnicas utilizadas para combater isso são diversas, depende de cada paciente, como a escuta empática, desmistificação de fantasias acerca da doença, redução de ansiedade e de angústia, validação de sentimentos, fortalecimento de vínculo com a equipe, fornecimento de materiais informativos sobre o diagnóstico e tratamento, entre outras”, explica a psicóloga.

Atualmente, o HDT tem 9.287 pacientes PVHA registrados na farmácia ambulatorial. Cerca de 20 novas pessoas são cadastradas semanalmente para buscar a medicação, considerada fundamental para que o paciente consiga ter uma vida ativa. O marceneiro S.A. faz parte da estatística do hospital há cerca de um mês, quando recebeu o diagnóstico do seu estado de saúde. Diferente de muitos outros, recebeu o apoio instantâneo da família, mas, ainda sim, o impacto negativo foi igual. “Eu chorei, não sei como peguei, tenho medo de ‘cair em uma cama’ e ficar por lá”, relata com olhos cheios de lágrimas.

Luciana explica que, para a psicologia, a família é uma extensão do paciente e também deve receber atenção para lidar com os medos e fantasias. Para tratar as diferenças de perfis de pacientes e suas famílias, o profissional da psicologia usa diversas abordagens, podendo ser individual ou em grupo, dependendo da dinâmica de cada familiar, do vínculo que existe e da disponibilidade deles em estarem presentes e serem acompanhados pelo serviço de psicologia. “o preconceito é algo real e muitas vezes cruel na vida do PVHA. Algumas famílias sofrem preconceito de conhecidos, já outras, o próprio familiar é a pessoa que exclui, a ponto de não deixar crianças chegarem perto da pessoa, tudo isso por falta de conhecimento”, revela.

“Muitas pessoas acham que se pode transmitir HIV no contato do dia a dia, pelo beijo na boca, abraço, por compartilhar talheres e isso não existe”, afirma Kobal. Os mitos sobre a doença surgiram pelo desconhecimento acerca do HIV e da Aids, nos anos de 1980, quando a mortalidade era de 100%. A infectologista esclarece que, atualmente, as pessoas com HIV que fazem tratamento corretamente e que estão com sucesso terapêutico, a expectativa de vida é igual à população geral que vive sem o vírus.

Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids), o Brasil hoje tem uma das maiores coberturas de tratamento antirretroviral entre os países de baixa e média renda, com mais da metade (64%) das pessoas vivendo com HIV. Segundo o Ministério da Saúde, 87% estão diagnosticadas, 55% do total estão em tratamento e 50% de todas as pessoas estimadas vivendo com HIV estão com carga viral suprimida.

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