Raquel Teixeira concede entrevista ao Jornal Opção
Secretária de Educação, Cultura e Esporte, Raquel Teixeira, concedeu entrevista ao Jornal Opção, esta semana. A extensa conversa com os jornalistas: Cezar Santos, Euler de França Belém e Augusto Diniz, tratou de vários assuntos relacionados às três áreas de gestão da pasta como melhoria na qualidade do ensino, investimentos em cultura e programas voltados ao esporte.
Confira íntegra da entrevista a seguir:
Titular da Seduce diz que está convencida de que as organizações sociais serão um sucesso e melhorarão tanto a vida de professores como a de alunos da rede estadual
Desde que assumiu a Secretaria do Estado da Educação, da Cultura e do Esporte (Seduce), no começo de 2015, Raquel Teixeira tem tido várias pautas importantes, polêmicas ou as duas coisas juntas – como é natural de sua área. Mas nenhuma a tem envolvido tanto como a transformação da gestão da rede estadual de ensino básico do atual modelo para o sistema de organizações sociais (OSs).
Não por acaso, o foco principal desta entrevista ao Jornal Opção é esse tema. Raquel confessa que tinha suas restrições à aplicabilidade das OSs com as particularidades da legislação brasileira, mas afirma que foi convencida pelo desenvolvimento do modelo que hoje está apresentado. Até o fim do ano, a intenção é de que pelo menos cinco macrorregiões e 170 unidades estejam atendidas. A secretária fala também sobre a reforma do ensino médio, recentemente aprovada pelo governo federal, e sobre as questões da cultura no Estado.
Cezar Santos – Como está hoje a questão da implementação das OSs [organizações sociais] na educação?
Euler de França Belém – Parece que a Justiça embargou o processo das OSs em Anápolis. Mas por que não implantar o sistema em outros municípios?
Nos próximos 10 ou 15 dias deve sair uma chamada para Águas Lindas e outra para Luziânia. Os projetos já estão prontos, mas, durante um período, esperamos que fosse resolvido o entrave de Anápolis. Porém, resolvemos publicar essa chamada para a região do Entorno do Distrito Federal.
Cezar Santos – O que houve mesmo com o caso de Anápolis?
Uma promotora entrou com uma liminar que foi acatada pela Justiça.
Euler de França Belém – Qual foi o argumento usado para a liminar?
Vários. O primeiro foi que a OS acaba com a gestão democrática nas escolas; outro, que a OS usaria o Fundeb [Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica] de forma errada; terceiro, que um contrato de 12 anos seria muito longo; e também que a OS seria inidônea. Basta um olhar um pouco mais cuidadoso sobre o projeto para perceber que não tem nada disso.
Nesses dois anos debruçados sobre esse trabalho, conseguimos construir um modelo de organização social com o que há de melhor no mundo, nas escolas “charter” [modelo aplicado nos EUA] e nas “academies” da Inglaterra, com a legislação brasileira. A LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação] fala em gestão democrática e mais uma série de coisas. Isso nos difere das charters e das academies, mas adaptamos o modelo de forma com que os diretores sejam eleitos pela comunidade – o que é norma da LDB, assim como a autonomia do conselho escolar, que assim permanece, com CNPJ próprio e recebendo recursos diretamente do Ministério da Educação, quando for o caso. Ou seja, essa acusação não procede, o projeto de OS de gestão compartilhada em Goiás prevê a manutenção da gestão democrática nas escolas.
Uma suposta aplicação equivocada do Fundeb também não se sustenta porque, como está claro no projeto, a OS vai abrir três contas conjuntas com a Secretaria da Educação: uma só com recursos do Fundeb; outra, com os recursos da Educação; e uma terceira com os recursos do Tesouro Estadual e da vinculação dos 25% [porcentual previsto pela Constituição para aplicação na área da educação pelos Estados]. Cada conta será acionada para pagar aquilo que for pertinente de acordo com cada origem de recurso.
Cezar Santos – E quanto aos 12 anos de contrato, tido como um período muito longo?
Essa preocupação sobre a duração do contrato não se sustenta também, porque a Lei Estadual sobre as OSs exige isto: um contrato de três anos renovável até o máximo de 12 anos. No nosso, somos mais exigentes até que a própria lei prevê, já que é um contrato inicial de três anos, mas passível de cancelamento a qualquer momento, caso seja verificado que a OS não esteja correspondendo ao previsto no edital.
Euler de França Belém – E sobre a desconfiança em relação à OS vencedora?
Cabe a quem faz a acusação provar qualquer inidoneidade em relação à entidade. Eu, particularmente, gosto muito da orientação pedagógica da OS que ganhou o edital. Ela é coordenada por um professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) que foi professor de educação básica e cuja mãe também foi professora a vida inteira. Ele hoje é professor universitário, mas apaixonado pela educação básica e com uma visão muito pertinente sobre escola. Não nos cabe qualquer ressalva por parte da secretaria, pelo contrário, estamos com bastante confiança nesse grupo vencedor. Esperamos que, no julgamento do agravo, essa liminar seja suspensa.
Augusto Diniz – Ainda sobre as OSs, o processo começou a ser em 2015. Até o fim do mandato falta apenas um ano e dez meses para implantar o projeto. Haverá tempo suficiente?
Sim. No primeiro ano, em 2015, ainda estávamos em um processo de busca de modelo. Como já disse, é um modelo inédito, sem similar no Brasil, que foi adaptado por nós de outros países para a LDB. No início de 2016, aí então tínhamos nos preparado completamente para esse processo. Fizemos um primeiro chamamento, mas as OSs que se apresentaram não corresponderam tecnicamente às demandas. A grande dificuldade para uma OS na área da educação – ao contrário do que ocorre na saúde, por exemplo – é que não existe nenhuma no setor no Brasil. E um dos argumentos que o Ministério Público usa é este: de que são OSs muito recentes, sem experiência. É verdade, mas isso não pode ser impeditivo de se tentar algo positivo, até porque são grupos recentemente construídos como OSs, mas composto por pessoas com larga vivência na educação.
A OS de Anápolis, por exemplo, tem todo seu projeto pedagógico conduzido por um professor da Universidade Federal de Santa Catarina, que já atuou na educação básica e que foi de conselhos de educação. Ou seja, tem vasta trajetória na educação, só que, como OS, tem existência recente.
Euler de França Belém – E por que o primeiro chamamento não foi bem-sucedido?
No primeiro chamamento, consideramos que não correspondiam ao que a secretaria pensava. Então, não houve vencedor. Entre aquele período e o chamamento de número 3, oferecemos formação para as OSs. As quase 30 instituições qualificadas em educação já foram convidadas para dois seminários com o Banco Mundial, que esteve aqui e fez evento aberto para quem quisesse participar. Convidamos todas as OSs qualificadas para o setor da educação em Goiás e em torno de 25 participaram. A qualidade do projeto delas realmente mudou no terceiro chamamento, porque entenderam o que um contrato de gestão por organização social e qual seu papel.
Em um primeiro momento, havia ficado uma situação de procurar se a gestão por OSs era constitucional ou não. É algo que o Supremo Tribunal Federal já decidiu: o governo tem a discricionariedade de oferecer o serviço público como achar melhor. As pessoas costumam fazer confusão entre o que é público é o que é estatal. O que é público? A escola é aberta a todos, sem discriminação de qualquer nível – raça, cor, gênero ou seja o que for; tem de ser transparente e é “vigiada”, digamos assim, pelos órgãos controladores da aplicação dos recursos públicos; e a qualidade dos serviços, esperamos, será melhor.
“Começamos 2017 sem dívida na área da cultura”
Euler de França Belém – Como está a situação hoje da Lei Goyazes e do Fundo de Cultura?
Eu creio que não haja reclamações atualmente, isso é uma etapa vencida. Na cultura, teve uma coisa que nunca tinha ocorrido: começamos 2017 sem nenhuma dívida, tudo estava absolutamente pago. Estamos trabalhando com os recursos para este ano.
Euler de França Belém – Para que finalidade é a Lei Goyazes?
É a versão goiana da Lei Rouanet, ou seja, é de incentivo fiscal e precisa captar o que a empresa pagaria de ICMS para a Fazenda é canalizado para projetos culturais. O Fundo de Cultura é diferente, são recursos maiores, do Estado, a fundo perdido, que têm editais separados – para música, patrimônio, audiovisual etc. Há também um fundo só para municípios, para incentivá-los. Em 2015, quando assumi, os critérios estavam pouco definidos. O grande trabalho foi fazer uma plataforma para que o processo fosse todo digital. O nível de dificuldade era de outra natureza, porque tinha produtor cultural e artista que não sabia lidar com computador.
Temos hoje pareceristas externos, que são convocados e tudo corre de forma anônima, o que é importante para um julgamento imparcial. O que há ainda há de reclamação é a alegação de que um parecerista externo não conhece Goiás e o trabalho desenvolvido aqui e faria, assim, uma avaliação inadequada. O que ocorre, porém, é que há uma demanda muito grande, como nunca houve, mas queremos fazer os ajustes necessários. Continuamos abertos a receber os artistas.
Euler de França Belém – Procede que o Fica [Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental, realizado anualmente na cidade de Goiás] ficou esvaziado?
O que poderia ser chamado de esvaziamento? Talvez o fato de termos acabado com os shows de nomes nacionais. O Fica não foi criado para receber shows de artistas nacionais. O foco está claro: é o audiovisual e a questão ambiental. Ocorre que as pessoas estavam indo para lá para ver show. Houve um desvirtuamento da concepção original do Fica, o que resgatamos agora.
Euler de França Belém – E para 2017, como está o Fica?
O edital voltou esta semana da Controladoria-Geral do Estado (CGE) com algumas considerações, mas está pronto.
Euler de França Belém – Como está a situação da biblioteca do Centro Cultural Oscar Niemeyer (CCON)? Ela vai sair mesmo do papel?
Pode ter certeza de que vai sair. A biblioteca terá acervo adquirido com recursos do Detran. Haverá um investimento em livros da ordem de R$ 2,5 milhões, para um acervo de 60 mil exemplares, sendo dois exemplares de cada título. No total, o valor da biblioteca será de R$ 5,5 milhões.
Euler de França Belém – É verdade que o local da biblioteca não suporta um peso grande, porque o prédio poderia cair?
Isso é mito (enfática). A decisão de não ocupar o segundo piso com a biblioteca não tem nada a ver com a fundação e a estrutura, mas com a necessidade de uma biblioteca virtual hoje em dia. É bom saber que lá não é uma biblioteca geral, mas de arte, de cultura, com livros específicos. Em 2015, a primeira coisa que eu fiz foi chamar o grupo da UFG que trabalhava com a seleção dos livros. Conversei com os professores e havia uma equipe montada. A Secretaria de Cultura, naquele momento, não tinha recursos para a biblioteca. Os livros custam R$ 5 milhões e o próprio prédio precisou de R$ 9 milhões, que vão sair agora, para uma reforma.
Cezar Santos – E qual é o problema do CCON?
É o mesmo de qualquer obra de Oscar Niemeyer. Não há saída de emergência, não tem segurança, uma série de exigências que a legislação atual requer, mas que os herdeiros não permitem que sejam feitas. Depois do acidente da boate Kiss [tragédia ocorrida em 2013, em Santa Maria (RS)], o Corpo de Bombeiros não abre mão de nada, ficou muito mais rigoroso. Então temos o rigor dos bombeiros de um lado e a intransigência da família Niemeyer de outro.
Euler de França Belém – Mas a família não está acima da Justiça.
Agora conseguimos o acerto e a reforma vai sair, em cerca de três meses.
Euler de França Belém – É verdade que há muitas infiltrações no prédio?
Essa reforma vai resolver os problemas. Há infiltrações, que não podem ser nem muitas nem poucas, têm de ser nenhuma, pois é um prédio de obras de arte nas galerias, um acervo que não pode ter qualquer tipo de infiltração.
Euler de França Belém – E o cinema?
A sala vai ficar pronta agora e já tem o vencedor da licitação, que foi o grupo Lumière.
Marcos Nunes Carreiro – Em relação às bibliotecas em geral no Estado, quanto a Seduce investe, em termos de compra de livros?
Temos o Centro Cultural Marieta Telles Machado, cuja biblioteca atende bem o público que a procura. É bem frequentada e as pessoas usam bastante o espaço. Com toda a restrição financeira por que passamos, conseguimos adquirir livros bons, uma coleção que vai para 150 bibliotecas escolares, as quais estamos selecionando agora. Ano passado foram R$ 200 milhões só para reformas de escolas. Tivemos uma plataforma digital, o Goiás 360, que foi premiada internacionalmente e criamos o material “Aprender Mais”; criamos também a Avaliação Diagnóstica Amostral (ADA), que nos mantém bem no Ideb e nos fez avançar muito na área pedagógica.
Euler de França Belém – Por que a Cia. Quasar, que deu tão certo na iniciativa privada, virou estatal?
A companhia iria fechar, chegaram a encerrar as atividades. Houve um apelo ao governador e finalmente chegamos à conclusão de que uma saída para não deixar com que o fechamento acontecesse seria entender a Quasar como vemos a Filarmônica. Como riqueza cultural, é uma ótima referência ter uma orquestra e um corpo de dança do Estado.
Euler de França Belém – Como essa situação será resolvida legalmente com o Estado?
A própria Quasar está constituindo uma OS para entrar na disputa do edital para um corpo de dança. Pode até não ganhar, já que vamos fazer um chamamento de OS para a orquestra e para o corpo de dança. Mas creio que terão tudo para ganhar, pela experiência e pelo conhecimento que têm, só que haverá um procedimento formal e legal.
Euler de França Belém – E sobre a Orquestra Filarmônica, como está a questão?
Eu gostaria de já ter resolvido isso, mas os caminhos burocráticos são complexos. Mas já podemos publicar o chamamento para a OS da Filarmônica.
Euler de França Belém – E o Tenpo [Mostra Nacional de Teatro de Porangatu], como está?
Tivemos a mostra em 2015. No ano passado, não houve, mas ela volta este ano.
Euler de França Belém – Como está a revitalização da Praça Cívica?
O projeto teve várias etapas. A primeira foi passar todos os prédios para a Seduce, proibindo atividades administrativas. A PGE [Procuradoria-Geral do Estado] ainda está lá, mas já providenciando a mudança. A reforma vai começar pela antiga Chefatura, depois a PGE, depois o próprio Palácio das Esmeraldas, o Centro Cultural Marieta Telles e o Museu Zoroastro Artiaga, além do TCE [Tribunal de Contas do Estado]. Todos vão passar por revitalização, restauro e musealização, um processo novo, de recheio de cada um daqueles museus. O projeto vai custar em torno de R$ 83 milhões e vai haver uma passarela unindo esses prédios todos. Em cada um haverá algo: cinema, biblioteca, exposição de arte, área gourmet, restaurante etc. Será um espaço cultural, musical, gastronômico. Vai revitalizar o Centro. Vamos criar um circuito, a ponto de se tornar atração turística. As pessoas vão curtir o conteúdo que haverá nos museus da Praça Cívica.
Marcos Nunes Carreiro – O Cine Cultura entra também nessa obra?
Com certeza, vai ser reformado e modernizado. Todos os projetos são bem modernos e estão disponíveis em catálogo no MIS [Museu da Imagem e do Som].
Euler de França Belém – A Vila Cultural está funcionando bem?
Muito bem. Se você for lá agora, verá uma exposição comemorativa. Mas queremos intensificar as atividades na Vila Cultural.