Especial PPSUS: Prevenção odontológica para aumentar a sobrevida de pacientes com câncer de boca

Tratamento com laserterapia é uma das alternativas recomendadas. Fonte: Divulgação.

Helenice Ferreira, da Assessoria de Comunicação Social da Fapeg

O câncer de boca apresenta alta taxa de mortalidade e morbidade. Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca), no Brasil, o câncer de cavidade oral é o quinto e o 11º tipo de neoplasia mais comum em homens e mulheres, respectivamente, com maior incidência em países como Índia, Austrália, Brasil, França e África do Sul. De origem complexa, a doença está associada ao tabagismo, deficiência de vitamina A, riboflavina e ferro, consumo de álcool, infecção pelo papiloma vírus humano (HPV), má higiene bucal, terapia imunossupressora e até mesmo a fatores genéticos.

Como modalidades terapêuticas são empregadas a radioterapia e a quimioterapia, que podem desencadear efeitos adversos como destruição dentária ou “cárie de radiação”, alterações na mucosa de revestimento, dermatite, candidose, xerostomia, dor, disfagia, rouquidão, osteorradionecrose, fibrose, trismo, perda do paladar, disfunção da tireoide, estenose esofágica, desnutrição, perda de peso, dentre outros.

Estes efeitos adversos resultantes da terapia, muitas vezes, levam o paciente à interrupção da radioterapia, o que, mesmo por poucos dias, já é suficiente para que as células tumorais presentes ou remanescentes em tumores ressecados possam entrar em processo de proliferação celular propiciando o crescimento tumoral. A recidiva tumoral, portanto, reduz a chance de cura e sobrevida de pacientes com Carcinoma Espinocelular (CEC) de cabeça e pescoço.

Equipes transdisciplinares
Para reduzir ao mínimo os efeitos adversos decorrentes dos tratamentos na cavidade oral (boca) é fundamental preparar o paciente antes, durante e após o início destas terapias adjuvantes, especialmente a radioterapia. Integrar equipes transdisciplinares de saúde (médicos, oncologistas, radioterapeuta, nutricionista, assistente social, psicólogo, odontólogos entre outros) para buscar minimizar e controlar estes efeitos é de suma importância para não se perder o controle do tumor. Neste contexto, a odontologia tem um papel fundamental na composição das equipes para redução das complicações orais no sentido de promover a qualidade de vida do paciente.

Uma pesquisa para avaliar os efeitos adversos da radioterapia na cavidade oral e o índice de adesão ao programa de preparo e controle odontológico de pacientes com câncer de boca submetidos a tratamentos adjuvantes de radioterapia e/ou quimioterapia no Hospital Araújo Jorge, em Goiânia, foi realizada pela Universidade Federal de Goiás (UFG) sob a coordenação do professor Elismauro Francisco de Mendonça, tendo como coexecutor o Hospital Araújo Jorge e como participantes pacientes do Sistema Único de Saúde.

O estudo
O projeto de pesquisa é um entre os 29 selecionados pela chamada pública 12/2013 no âmbito do Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS): Gestão Compartilhada. O PPSUS tem por objetivo apoiar atividades de pesquisa científica, tecnológica ou de inovação que promovam a formação de recursos humanos qualificados e a melhoria da qualidade de atenção à saúde no contexto do SUS. A chamada é uma parceria da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) com o Ministério da Saúde, Secretaria Estadual da Saúde e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

A pesquisa avaliou a influência das medidas de cuidados (protocolo de prevenção e cuidados odontológicos) na interrupção ou paralisação da radioterapia e sua relação com a sobrevida do paciente após a finalização do tratamento oncológico (radioterapia) entre 1989-2009 (um estudo retrospectivo baseado nos registros do prontuário médico do paciente), em uma primeira fase; e na segunda, avalia de maneira prospectiva, 33 pacientes nos anos 2016 e 2017 (acompanhamento clínico dos pacientes na odontologia do Hospital Araújo Jorge com câncer na região de cabeça e pescoço).

O protocolo de prevenção, segundo Elismauro de Mendonça, inclui medidas de cuidados com a cavidade bucal (dentes e mucosas) necessárias para prevenir as complicações antes, durante e após a radioterapia e quimioterapia. Essas medidas de cuidados da boca incluem bochechos com fluoreto de sódio, conhecido como flúor, três vezes ao dia, ingestão de 1,5 litros de água/dia (hidratação), remoção dos focos de infecção (remoção de cárie ou dentes infeccionados, dentes com mobilidade acentuada), boa higiene oral ou escovação dos dentes, incluindo o uso do fio dental; laserterapia diária e cuidados com a prótese, dentaduras ou pontes de grampo. A laserterapia, explica ele, é uma técnica realizada através de um aparelho que emite ou libera uma luz visível sobre a boca para prevenir o aparecimento de feridas na boca, semelhantes a aftas (mucosite), durante a quimioterapia e radioterapia.

mucosite
Mucosite na língua, um dos efeitos mais comum da radioterapia na região de câncer de cabeça e pescoço. Foto: Divulgação.

Resultados
Os principais resultados da pesquisa apontados pelo coordenador do estudo são: pacientes com maior adesão ao protocolo de prevenção odontológica surpreendentemente tiveram mais interrupção da radioterapia como consequência dos sintomas do tratamento para o câncer de boca, especialmente a radioterapia. No entanto, esses pacientes conseguiram completar o protocolo de radioterapia (35 sessões em média) estabelecido pela equipe de radioterapia do Hospital Araújo Jorge. O período de sobrevida dos pacientes após o tratamento do câncer de boca foi maior no grupo com maior adesão às medidas preventivas. Foi observado que adesão ao protocolo de prevenção odontológico contribuiu para aumentar a sobrevida e qualidade de vida dos pacientes por meio da redução dos efeitos adversos da radioterapia na boca, principalmente os efeitos da mucosite.

Os resultados desse estudo ampliam o conhecimento no campo do tratamento oncológico e fortalecem a importância da odontologia como parte das equipes transdisciplinares de saúde no tratamento do paciente com câncer de cabeça e pescoço. Além disso, os resultados podem auxiliar nas tomadas de decisões para implantação de políticas públicas de saúde que beneficiem o paciente portador de câncer na região cabeça e pescoço.

“Com certeza, nossos resultados poderão viabilizar a implantação da Laserterapia com laser de baixa potência nos Centros Especializados Odontológicos do SUS, por ser uma alternativa de baixo custo e efetiva para o controle de complicações da radioterapia e quimioterapia nos pacientes portadores de câncer na região de cabeça e pescoço”, argumenta Elismauro Mendonça.

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