Pesquisa fomentada pelo Governo de Goiás é apresentada em evento internacional
Utilizando uma abordagem híbrida experimental/computacional, pesquisadores desenvolveram uma nova ferramenta web que aliada a cálculos de modelagem molecular é capaz de mitigar problemas ambientais provocados por contaminantes como pesticidas, compostos farmacêuticos, produtos industriais e químicos provenientes das atividades humanas. A apresentação dos resultados acontecerá no dia 10 de maio, em Roma
Helenice Ferreira, da Assessoria de Comunicação da Fapeg
Pesquisa fomentada pelo Governo de Goiás, por meio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) será apresentada no próximo dia 10, no Teatro di Villa Torlonia – em Roma, durante um evento internacional. O workshop “Complex Systems: from Physics to Biomedicine”, é uma realização da Accademia Nazionale delle Scienze detta del XL (Academia Nacional de Ciências), em homenagem a Giorgio Parisi (que compõe o trio de cientistas vencedores do Nobel de Física de 2021).
O evento traz como proposta discutir sistemas complexos e a necessidade de novas abordagens que promovam a integração das ciências da vida a partir de abordagens experimentais e computacionais para uma melhor compreensão da complexidade biológica e descoberta de novas formas para o enfrentamento dos urgentes desafios econômicos e sociais mundiais.
O professor Valter Henrique Carvalho Silva, da Universidade Estadual de Goiás (UEG), foi convidado para apresentar os resultados de sua pesquisa “Destinação Ambiental de Poluentes Emergentes em Águas Superficiais e Alternativas Sustentáveis de Mitigação: Abordagem Híbrida Experimental-Computacional”, que recebe fomento da Fapeg por meio da Chamada Pública Colaborativa lançada em setembro de 2020 pela Fapeg e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
Um dos resultados da pesquisa foi o desenvolvimento de um aplicativo web gratuito e fácil de usar ( http://www.pysirc.com.br/ ), baseado em aprendizado de máquina holístico combinado com modelos de impressões digitais moleculares que permitem a compilação de parâmetros cinéticos e a interpretação mecanística da oxidação de poluentes baseada em ataque radicalar em consonância com os princípios da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Basta informar o formato SMILES ou Número CAS de uma molécula específica.
A pesquisa
O projeto de pesquisa do professor Valter Carvalho-Silva busca otimizar processos químicos que permitam mitigar a ação de poluentes emergentes propondo alternativas viáveis que incluem o uso de processos de oxidação baseados em radicais usando tanto abordagem experimental – através do método de cinética de competição – quanto protocolos teóricos – formulações de cinética, de química quântica e cálculos de aprendizado de máquina
Ainda na Itália, o professor Valter também foi convidado para uma visita técnica à Universidade de Perúgia, na região de Umbria, para, junto com o professor Vincenzo Aquilante, membro da Academia Nacional de Ciências, desenvolver uma ferramenta de inteligência artificial para processos de degradação que dependa da temperatura e da estrutura molecular.
O convite
O tema da apresentação oral do professor no workshop será Kinetics of environmental biocomplexity: experiments, quantum chemistry, transitivity theory and machine learning (Cinética da biocomplexidade ambiental: experimentos, química quântica, teoria da transitividade e aprendizado de máquina). O convite para participação do professor Valter Carvalho-Silva foi mediado pelo professor Vincenzo Aquilanti (professor Emeritus do Departamento de Química da Universidade de Perúgia e membro da Academia Nacional de Ciências da Itália), colaborador do projeto e uma das maiores lideranças em cinética de processos reativos do mundo. “O professor Aquilanti tem sido um parceiro de longa data da UEG e tem dado contribuições significativas no desenvolvimento de tópicos avançados e tecnológicos de química para a região Centro-Oeste”, destaca Valter Carvalho-Silva.
Valter Carvalho-Silva comenta sobre a necessidade da construção de modelos matemáticos preditivos de forma integrada para encontrar soluções para os processos fisiológicos ou patológicos complexos. “Estas abordagens devem ter suporte nos algoritmos de aprendizado de máquina capazes de explicar a complexidade molecular organizada dos sistemas vivos”, explica. Segundo ele, em sua pesquisa, algoritmos de aprendizado de máquina foram implementados e todos os modelos forneceram alta qualidade de ajuste para degradação baseada em radicais em ambientes aquáticos e atmosféricos. “Nossos modelos e interfaces podem estimular e expandir a aplicação e interpretação de pesquisas cinéticas sobre contaminantes em unidades de tratamento de água e ar baseadas em tecnologias oxidativas avançadas”, revela o pesquisador.
O pesquisador chama a atenção para a importância de fomento como este da Fapeg em pesquisas de base aliadas a demandas tecnológicas capazes de propiciar soluções para tratar problemas ambientais que podem afetar o setor produtivo de Goiás, do Brasil e do mundo. “Mostra ainda para a comunidade internacional, a competência do Grupo de Química Teórica e Estrutural de Anápolis (UEG) em lidar com problemas ambientais tão complexos através de pesquisas no estado-da-arte”, ressalta.
Resultado da pesquisa
O pesquisador explica que a ferramenta web é capaz de estimar a reatividade de processos ambientais, no caso, de poluentes orgânicos em ambientes aquáticos e atmosférico (pesticidas, fármacos, hormônios, esteroides e outros) baseados em processos oxidativos. Segundo ele, este protocolo de inteligência artificial com aplicação web promete se tornar uma ferramenta acessível (considerando os custos de equipamentos atualmente utilizados) e de larga escala para ser usada, por exemplo, por pesquisadores, acadêmicos e por pessoas que estão diretamente ligadas à tomada de decisões em estações de tratamento de água e esgoto.
Pela ferramenta, a reatividade dos poluentes é estimada e proporciona uma previsão do grau de degradação para um composto químico específico sem a necessidade de qualquer custo experimental ou de modelagem molecular. Uma previsão que levaria meses de estudos poderá ser feita com rápidos clicks na nova plataforma computacional, a um baixo custo.
O professor explica que sua pesquisa partiu da premissa de que, “os Contaminantes de Interesse Emergente (CIE) ou Micropoluentes de Interesse Emergente como pesticidas e fármacos têm sido representantes significativos na contaminação de águas e solos no Estado, uma vez que Goiás é um dos maiores consumidores de pesticidas e um dos maiores produtores de fármacos do Brasil”. Em Goiás localiza-se um dos principais polos industriais brasileiros, instalado em Anápolis, com empresas nos setores farmacêuticos, alimentícios, têxteis, adubos e automobilístico – o Distrito Agroindustrial de Anápolis (Daia). Goiás também tem sua economia fortemente baseada na agropecuária e essa liderança impacta diretamente na dependência crescente dos pesticidas. O passivo ambiental também pode ser amplificado pelo descarte indiscriminado de medicamentos em esgoto residencial por pessoas físicas, farmácias, hospitais e unidades de saúde.
Para compreender e contornar este desafio, pesquisas ganham destaque com a interação entre diferentes áreas das ciências em busca do desenvolvimento de tecnologias capazes de minimizar a emissão e a ação desses compostos em ambientes aquáticos. A otimização de processos químicos que permitam a mitigação de poluentes emergentes utilizando uma abordagem híbrida experimental-computacional foi proposta pelo pesquisador Valter Henrique Carvalho Silva em parceria com o pesquisador Antônio Carlos do Departamento de Engenharia Química ‒Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (AdOx-CESQ/PQI-EPUSP).
A pesquisa, então, propôs avaliar a persistência ambiental destes contaminantes emergentes no Estado de Goiás; determinar mecanismos de degradação em águas superficiais goianas e caracterizar seus produtos; estudar processos sustentáveis para remoção desses poluentes antes do descarte no meio ambiente; e desenvolver novas ferramentas computacionais capazes de predizer o tempo de vida de um poluente emergente em corpos d’água.
Passo a passo da pesquisa
Valter Carvalho explica que em um primeiro estudo, através de uma abordagem de modelagem molecular e cinética teórica avançada, foram avaliados os mecanismos, a cinética e a avaliação da toxicidade da degradação do Picloram, um pesticida amplamente utilizado no mundo – iniciado por radicais OH indicando que: duas vias favoráveis de degradação ocorrem pela adição ao anel piridina. O Picloram e a maioria dos produtos de degradação são considerados nocivos; entretanto, esses compostos podem sofrer fotólise pela luz solar possibilitando rodas de degradação que mitiguem a sua toxicidade. No entanto, explica ele, o método cinético de competição e a descrição através de métodos de química quântica tornam a análise de degradação um empreendimento hercúleo, considerando os custos de equipamentos e os esforços computacionais dedicados. “Para superar estes exigentes procedimentos, desenvolvemos, então, este aplicativo web gratuito e fácil de usar”.
Adicionalmente, serão apresentados durante o evento, os resultados preliminares de trabalhos em colaboração com o Laboratório de Análise de Águas (LAnA) da Universidade Federal de Goiás (UFG). O professor explica que, em um trabalho prévio, os profissionais da UFG identificaram traços de vários pesticidas em mananciais superficiais em 13 áreas no Estado de Goiás decorrentes do uso e ocupação do solo por comunidades rurais e tradicionais. Segundo ele, “o trabalho deles não consegue aferir o quão prejudicial estes compostos químicos podem ser para as comunidades. Neste sentido nossos protocolos pretendem estimar o tempo que estes pesticidas ficam disponíveis na biota aquática, e o nível de toxicidade dos pesticidas e dos subprodutos gerados a partir dos processos de degradação natural. Utilizando nossas interfaces de inteligência artificial com modelagem molecular, tais análises tornam-se rápidas e acuradas, auxiliando na otimização dos protocolos para sua utilização de forma segura ou na tomada de decisão de quais pesticidas são seguros para utilização pelas comunidades rurais e tradicionais”.
Chamada Fapeg/Fapesp
O projeto de pesquisa foi selecionado na Chamada Pública Colaborativa lançada em setembro do ano passado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg). A chamada tem como objetivo fomentar o desenvolvimento de parcerias científicas e o fortalecimento de redes de pesquisa colaborativa envolvendo os dois estados. A pesquisa estabelece parceria entre o grupo de Química Teórica e Estrutural (QTEA) da UEG, Modelagem Molecular, sob a coordenação do professor Valter Carvalho-Silva, e o grupo de Pesquisa em Processos Oxidativos Avançados (AdOx) da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, Técnicas Experimentais de Degradação de Micropoluentes, sob a coordenação do professor Antônio Carlos Teixeira.
O pesquisador é vinculado aos cursos de Física e Química Industrial da UEG; faz parte do programa de mestrado em Ciências Moleculares da UEG e do programa de doutorado em Química da UnB. Ministra as disciplinas Química Geral, Físico-Química Experimental, Química Quântica, Escrita Científica de Alto Impacto, Cinética e Dinâmica de Reações Químicas e Métodos Computacionais de Modelagem Molecular.