Especial PPSUS: Incidência e fatores de dores pós-cesariana são objetos de pesquisa

Foto: Divulgação.

Helenice Ferreira, da Assessoria de Comunicação Social da Fapeg

Dor. A Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) define como uma experiência sensitiva e emocional desagradável associada a uma lesão real ou potencial ou descrita em termos de tal lesão. Essa experiência pode ser classificada de acordo com a localização, tempo de existência, mecanismos envolvidos, intensidade, periodicidade e qualidade. É sempre subjetiva, ou seja, existe quando alguém diz que existe. A dor pós-operatória é forma prevalente de dor aguda no ambiente hospitalar. Apresenta-se com características nociceptivas e/ou neuropáticas, e advém de lesões e manipulação de órgãos e tecidos. Essa experiência pode causar sofrimento adicional em curto e longo prazo na vida das pessoas que se submetem a procedimentos cirúrgicos.

No caso da cirurgia cesariana, em que as taxas mundiais evidenciam crescimento exagerado na prevalência, muitas mulheres podem ter sobre si sofrimento adicional desnecessário, que prejudica a recuperação pós-operatória e a relação mãe-filho, além de poder tornar-se crônica e persistir por tempo maior que o esperado para a cura da ferida operatória, prejudicando a qualidade de vida das mulheres.

PPSUS
Conhecer a extensão do problema dor pós-operatória aguda e crônica persistente no pós-cesariana, bem como, os fatores que contribuem na identificação das mulheres que estão em maior risco de vivenciar tal experiência foi a proposta de pesquisa, coordenada pela professora da Universidade Federal de Goiás (UFG), Lílian Varanda Pereira, selecionada pela Chamada Pública 12/2013 no âmbito do Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS): Gestão Compartilhada, que contemplou 29 propostas. O PPSUS tem por objetivo apoiar atividades de pesquisa científica, tecnológica ou de inovação que promovam a formação de recursos humanos qualificados e a melhoria da qualidade de atenção à saúde no contexto do SUS.

A chamada é uma parceria da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) com o Ministério da Saúde, Secretaria Estadual da Saúde e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Participaram desta pesquisa, 1.062 mulheres com idade superior a 14 anos (média de 25,2 anos), internadas para parto cesáreo em uma instituição de saúde de natureza privada, de médio porte, conveniada com o Sistema Único de Saúde (SUS) em Goiânia.

Ansiedade
dor pós-cesariana
Dentre as mulheres entrevistadas, 92,2% referiram dor no período pós-operatório imediato, e destas, 78,4% julgaram a dor como moderada-intensa, “considerada clinicamente inaceitável”, comenta Lílian Pereira. O fator preditor mais consistente dessa dor foi a ansiedade pré-operatória, ou seja, mulheres que estavam mais ansiosas no período pré-operatório apresentaram risco quase duas vezes maior de sentir dor com intensidade elevada depois da cirurgia do que aquelas que estavam menos ansiosas.

Segundo Lílian Varanda, as evidências elaboradas corroboram os resultados de estudos anteriores ao colocarem que, apesar dos avanços tecnológicos e fármacos disponíveis, a dor pós-operatória aguda ainda é subavaliada e subtrada. “Isso é preocupante, pois, a dor pós-operatória de elevada intensidade, inadequadamente aliviada, tem sido evidenciada como um dos fatores mais importantes na persistência dessa dor”.

Ao se obter um melhor controle da dor, sofrimentos desnecessários são evitados e os custos são reduzidos com as possíveis complicações que requeiram maior tempo de internação. Além de atrapalhar a retomada das atividades normais, a dor acaba impedindo um bom contato com o bebê e um bom posicionamento para a amamentação.

Outros dados da pesquisa
A pesquisa revela que com relação às mulheres adolescentes, porcentagem ainda maior (94,6%) referiu dor no período pós-operatório imediato, e 48,4% delas julgaram a intensidade de sua dor como forte-pior possível. Adolescentes que referiram dor pré-operatória intensa e que tiveram o tempo da cirurgia mais prolongado tiveram maior risco de referir dor de intensidade elevada. Por outro lado, aquelas que receberam dois analgésicos opioides associados ao anestésico no momento da raqui-anestesia referiram menor intensidade de dor do que aquelas que receberam apenas um dos analgésicos.

“Ao estudarmos a dor pré-operatória – preditor consistente de dor pós-operatória de intensidade elevada -, referida pelas mulheres pouco antes de serem levadas para o centro cirúrgico, para as cesarianas, evidenciamos que a maior frequência de dor foi referida na região lombar, pélvica/genital e cabeça; as queixas eram diárias para a maioria e a intensidade forte prevaleceu. As mulheres que disseram estar com dor que teve início durante a gestação e aquelas que estavam mais ansiosas tinham maior chance de referir dor antes da cirurgia”, analisa a pesquisadora.

Ainda em andamento – os dados estão em fase de análise e digitação – a pesquisa está mensurando a intensidade, qualidade e características da dor que persiste em algumas mulheres até o 24º mês após a cesariana e os fatores que aumentam o risco dessa dor persistir. Lílian comenta que muitas mulheres estão nessa situação.

Incorporação da pesquisa fomentada pelo SUS

equipe da pesquisa e o professor Olavo Marquez da Universidade Federal do Triângulo Mineiro
Equipe que realizou a pesquisa e o neurologista Jaime Olavo Marquez, professor da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, em evento na UFG.

Segundo a coordenadora do estudo, para a incorporação dos resultados da pesquisa pelo SUS, “entendemos que será necessário apresentá-los às pessoas responsáveis em Goiânia (gestores de saúde) para que a rotina do serviço de atendimento às gestantes seja (re)visitada e novas formas de prevenção e tratamento da dor desde o início da gestação até o pós-operatório sejam introduzidas”. Uma das necessidades fundamentais, aponta ela, é a avaliação biopsicossocial das mulheres em todas as fases da gestação e do perioperatório. ” Ademais, orientar as gestantes quanto aos prejuízos invisíveis da cirurgia cesariana – como a dor pós-operatória persistente -, pode contribuir na redução das taxas dessa cirurgia, meta do Ministério da Saúde”.

Lílian ressalta que recentemente a proposta de um Protocolo de Atenção Básica – Dor Crônica entrou em Consulta Pública. “Essa é a primeira etapa do processo de elaboração de um protocolo baseado em evidências voltado para as equipes de Atenção Básica.

A elaboração de um Protocolo de Dor Crônica “busca qualificar a atenção ao cuidado da dor crônica e a tomada de decisão dos profissionais da atenção primária a saúde/atenção básica com base nas evidências, programas e políticas de âmbito nacional, sendo complementar com outras publicações do Ministério da Saúde, como Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, Cadernos de Atenção Básica e Protocolos de Encaminhamento da Atenção Básica para a Atenção Especializada, além de contribuir para a organização dos serviços e a melhoria do acesso das pessoas a esses serviços”.

“Acreditamos que os resultados da pesquisa podem contribuir para a implantação do protocolo de atendimento aos usuários com dor crônica, repercutindo diretamente na melhoria da atenção à saúde das mulheres e consequentemente, dos recém nascidos”, finaliza a pesquisadora.

Conheça outros projetos contemplados no PPSUS aqui.

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