Especial PPSUS: Pesquisa busca traçar perfil de crianças traqueostomizadas

Exemplo de um procedimento de traqueostomia. Foto: Divulgação/Internet

Letícia Santana, da Assessoria de Comunicação Social da Fapeg

A traqueostomia é um procedimento cirúrgico que estabelece comunicação direta entre a traqueia e o meio externo. A criança nessas condições, em especial o lactente e o recém-nascido, tem maior morbidade e mortalidade quando comparada a adultos. No Brasil, ainda faltam padronização nos cuidados com essas crianças, equipamentos e treinamento dos profissionais da área da saúde para lidar com esses pacientes específicos.

Diante dessa realidade observada pela professora adjunta da Universidade Federal de Goiás (UFG) e da Pontifícia Universidade Católica (PUC Goiás), a otorrinopediatra Dra. Melissa Avelino, foi iniciada uma pesquisa para traçar o perfil das crianças traqueostomizadas atendidas em hospitais terciários. A pesquisa começou em duas instituições: UFG e Unicamp. Depois, outras duas instituições federais também passaram a fazer parte da pesquisa, ambas de Porto Alegre.

“A criança portadora de traqueostomia é um indivíduo extremamente vulnerável com risco iminente de obstrução das vias aéreas e, portanto, de morte. Ela sofre não só com as limitações físicas da traqueostomia, mas também com o prejuízo psicológico e com o preconceito. Melhorar sua qualidade de vida deve, então, ser uma meta”, diz a professora.

Segundo Melissa, enquanto em outros países o tema é discutido constantemente, criando-se programas e protocolos específicos, no Brasil, nos serviços públicos de forma geral, um número crescente de crianças são traqueostomizadas sem diagnóstico prévio da causa da obstrução das vias aéreas superiores. Daí a importância de também compreender como está sendo avaliada a necessidade do procedimento.

Artigo
Artigo foi publicado no Brazilian Journal of Otorhinolaryngology (BJORL). Foto: Divulgação.

Faltam diretrizes
Dados apresentados sobre o panorama desta questão mostram que, enquanto as taxas de mortalidade relacionadas à traqueostomia em crianças são de 0% a 5,9% na literatura internacional, um estudo brasileiro realizado em Porto Alegre em 2009 relatou uma taxa de mortalidade de 4%. Esta carência de padrão do atendimento acontece, no País, devido à falta de diretrizes nacionais para orientar o SUS e a Agência Nacional de Saúde (ANS), o que se reflete na falta de material necessário para cuidar desses pacientes, como cânulas de traqueostomia nos serviços de assistência médica.

“Mesmo nos grandes centros e hospitais terciários não se tem material básico. Essas crianças são pertencentes ao sistema, mas não existe código no SUS que contemple a realização deste procedimento, que deveria ser realizado mensalmente. Muitas vezes, essas crianças ficam perdidas no sistema público, pois não existe um fluxo adequado de encaminhamento e seguimento das mesmas”, relata Melissa.

Ela aponta, também, que ainda existe a dificuldade em se encontrar profissionais preparados, com base em diretrizes, para orientar a família que está envolvida, e recomenda a criação de equipes de cuidados específicos para otimizar os cuidados, o que ainda pode resultar em redução dos custos hospitalares.

Frente a esse cenário, os primeiros passos já foram dados e os resultados positivos têm surgido. No mês de fevereiro deste ano, foi realizado o Primeiro Consenso e Recomendações Nacionais em Crianças Traqueostomizadas, cujos resultados deram origem ao artigo “First Clinical Consensus and National Recommendations on Tracheostomized Children of the Brazilian Academy of Pediatric Otorhinolaryngology (ABOPe) and Brazilian Society of Pediatrics” (Primeiro Consenso Clínico e Recomendações Nacionais em Crianças Traqueostomizadas da Academia Brasileira de Otorrinolaringologia Pediátrica (ABOPe) e Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).

“Este [documento] com certeza poderá auxiliar médicos e profissionais de saúde em todo Brasil”, afirma Melissa. Para a elaboração do documento, publicado no volume 83, número 5, de setembro/outubro de 2017 do Brazilian Journal of Otorhinolaryngology (BJORL), foi selecionado um grupo de especialistas com experiência em traqueostomia na infância (otorrinolaringologistas, pediatras intensivistas, endoscopistas, pneumopediatras) com comprovada atuação prática no assunto, e que também contemplassem as diversas regiões do Brasil, respeitando os critérios de inclusão e exclusão.

Os resultados foram gerados partir da concordância da maioria dos participantes em relação às indicações, tipo de cânula, técnicas cirúrgicas, cuidados e orientações gerais e decanulação. No documento é possível encontrar as diretrizes da traqueostomia em crianças como, por exemplo, que toda cirurgia deve ser realizada em um centro cirúrgico; deve-se avaliar as vias aéreas endoscópicas antes da cirurgia para conhecer as causas da obstrução respiratória e com base nos achados decidir a melhor localização para a traqueostomia; há conselhos sobre a técnica de aspiração; como se deve orientar os pacientes, entre outras diretrizes.

tabela canula traqueostomia em criancas
O estudo recomenda, por exemplo, o diâmetro da cânula, de acordo com a idade da criança. Fonte: Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.

A professora informa que o objetivo é dar continuidade a este trabalho para que num futuro próximo, junto ao Ministério da Saúde, estabeleça-se o protocolo de condutas e fluxogramas de atendimento para crianças traqueostomizadas.

Projeto contemplado pela Fapeg
Este projeto de pesquisa da professora Melissa está entre os 29 selecionados pela Chamada Pública nº 12/2013 no âmbito do Programa Pesquisa para o SUS (PPSUS): Gestão Compartilhada. O PPSUS tem por objetivo apoiar atividades de pesquisa científica, tecnológica ou de inovação que promovam a formação de recursos humanos qualificados e a melhoria da qualidade de atenção à saúde no contexto do SUS.

A chamada é realizada por meio da parceria da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) com o Ministério da Saúde, Secretaria Estadual da Saúde e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

Conheça outros projetos contemplados no PPSUS aqui.

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