Empresa fomentada pela Fapeg lança primeiro software do país para enfrentamento da epidemia de dengue
O software desenvolvido pela Mindify, que já foi utilizado na época da maior crise da pandemia de covid-19, foi contratado, agora, pelo Governo de Goiás para auxiliar no combate à dengue. A versão piloto do software tem previsão de lançamento para o final do mês de maio
Após receber fomento do Tecnova II, programa subsidiado pela Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), em parceria com o Governo de Goiás e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg), a Mindify, uma empresa especializada na automação de processos complexos, especialmente na área da Saúde, conhecidos como linhas de cuidado, conseguiu coordenar estratégias de larga escala para auxiliar no combate da pandemia de covid-19. O software goiano é pioneiro neste caso no país.
O Tecnova é um programa direcionado para fomentar empresas que tenham projetos de desenvolvimento de produtos, serviços ou processos inovadores com recursos de subvenção econômica. O projeto tinha como objetivo criar funcionalidades de inteligência artificial para acelerar o desenvolvimento e aprimoramento de protocolos médicos automatizados, de forma descentralizada e colaborativa, para facilitar a configuração das linhas de cuidado possibilitando respostas rápidas às epidemias.
O presidente da Fapeg, Marcos Arriel, pontua que o desenvolvimento desse software pela empresa fomentada pela Fapeg, é um marco não apenas para Goiás, mas para todo o país. “Estamos vendo o poder da inovação e da tecnologia sendo aplicado de forma significativa no enfrentamento de doenças como a dengue. É uma conquista importante e demonstra o potencial das parcerias entre instituições públicas e privadas na promoção da saúde e bem-estar da população”, diz.
Após dois anos de desenvolvimento, a solução veio como um software que traz como diferencial o robô Mindy, criado com apoio do Tecnova II, que permite que linhas de cuidado complexas sejam automatizadas com uma fração do custo e tempo requerido por outras soluções. O próprio robô cria softwares automaticamente, sem necessidade de desenvolvedores de software, tanto para os médicos, quanto para pacientes e gestores de Saúde para que todos possam executar as suas respectivas tarefas dentro de uma linha de cuidado e assim o desfecho do tratamento seja o melhor possível.
Controle da dengue
Hoje, a solução já ganha novas aplicações. O Governo do Estado de Goiás contratou a tecnologia da Mindify para auxiliar no enfrentamento da epidemia de dengue. Segundo o CEO da Mindify, André de Paula Ramos, “a linha de cuidado está sendo construída com apoio das funcionalidades criadas durante o projeto do Tecnova II e a versão piloto do software tem previsão de lançamento para maio de 2024”. Ramos explica que o software já está no mercado, mas trata-se de uma solução para empresas ou para governos. “Logo quem tem acesso são as pessoas atendidas pelas instituições contratantes. Em breve lançaremos um piloto com o Governo de Goiás a partir do qual a população poderá usar para endereçar situações relativas à dengue”, comemora.
Na eventualidade de uma nova pandemia, que tem grandes probabilidades de acontecer, a solução desenvolvida pela Mindify se torna capaz de rapidamente compilar os melhores protocolos médicos para enfrentamento e os organizar dentro de uma linha de cuidado no software. O grande objetivo da empresa, segundo André Ramos, é que o software seja distribuído em todo o Brasil, “e porque não no mundo todo, para ajudar as equipes de saúde a padronizarem o enfretamento e a coletarem dados para aperfeiçoamento da estratégia de combate. Isso mudaria o jogo, sem dúvidas, incontáveis vidas seriam salvas e muito dinheiro seria economizado”.
A Mindify é uma solução destinada aos prestadores de serviço da Saúde públicos e privados. Secretarias da Saúde estaduais e municipais, operadoras de Saúde e hospitais de referência contratam a solução para automação de uma infinidade de processos operacionais e, especialmente, de linhas de cuidado. “Depois de configurado o software, os usuários são as equipes médicas e a própria população, cada usuário vendo uma solução específica para suas respectivas necessidades, mas todas essas necessidades são devidamente coordenadas entre os vários usuários. Ou seja, uma ação do médico gera uma tarefa para o paciente e uma eventual ação do paciente pode gerar uma tarefa para o prestador de serviço. Vale destacar que neste processo de troca de tarefas entre os diferentes usuários a maior parte das ações são resolvidas sozinhas pelas automações da Mindify”.
Ganhando o mundo
Em razão do sucesso alcançado, a Mindify foi selecionada recentemente pelo Centro de Excelência em Inteligência Artificial (CEIA-UFG) para investir em projetos de inovação com IA aplicada à Saúde e auxiliar equipes médicas a aplicarem linhas de cuidado em larga escala. Neste projeto ele conta que a própria Mindify está investindo R$ 5 milhões sendo que parte deste valor tem o subsídio da Embrapii e Sebrae, e o foco é a mineração de processos e outras técnicas de IA para ajudar equipes de Saúde a serem mais eficientes. “A expectativa é que no final de 2024 já tenhamos produtos novos inovadores para o mercado global”. O Ceia desenvolve soluções inovadoras de alto impacto, por meio do uso de dados e inteligência artificial. Foi lançado em 2019 por meio de uma política pública da Fapeg no formato de tríplice hélice – academia, governo e empresas. O Ceia também é uma unidade Embrapii- Associação Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial.
André Ramos explica que a Saúde “é um sistema complexo no qual todos os envolvidos têm a obrigação de fazer a sua parte corretamente e na hora certa. Ou seja, é preciso coordenação, porém para haver coordenação é preciso que todos os envolvidos tenham a clara compreensão do que está acontecendo e isso nem sempre acontece”. É aí que entra o projeto, que vai buscar nos algoritmos de IA sugestões de condutas e de justificativas para estas sugestões aos profissionais de saúde. “Serão criados mecanismos simples de usar para fomentar a educação médica continuada ainda dentro dos consultórios.”
Para o empresário, com o arranjo cooperativo entre Mindify, Sebrae, Embrapii e Ceia-UFG o ecossistema de inovação brasileiro se fortalece e, sem dúvidas, os resultados irão impactar todo o sistema de Saúde, dentro e fora do Brasil.
André destaca que, “quem atua com inovação de ponta de verdade precisa continuidade nos fomentos, quando terminamos um projeto normalmente há descoberta de novos problemas. Trata-se de um ciclo de inovação similar ao que é feito nas universidades onde uma pesquisa gera insumos para a próxima em um ciclo longo”.
Tecnova
A seleção das empresas que vão ser beneficiárias do Programa Tecnova é executada por meio de editais. Os aprovados recebem fomento da Fapeg e da Finep por meio da modalidade subvenção econômica (não reembolsável) com o objetivo de compartilhar com as empresas os custos e riscos com projetos de inovação que envolvam significativo risco tecnológico associado a oportunidades de mercado.
André pontua que a criação de inovações envolve grandes riscos técnicos e financeiros. “Sem fomentos como os disponibilizados pela Fapeg seria impossível atingirmos o nível de inovação que temos hoje. Projetos de inovação normalmente falham, falham tecnicamente ou falham no acesso ao mercado [vendas], logo inovar é uma roleta para pequenas empresas. Inovar requer foco, logo o empreendedor deixa de se concentrar nas vendas para inovar e assim perde faturamento com o risco de a inovação ser tecnicamente inviável ou de não vender. Uma falha toma 10 anos de um empreendedor. De todo modo, quando um negócio inovador dá certo ele gera um incrível valor para a sociedade. No caso do nosso projeto é a chance de combater de forma efetiva um vírus mortal. Sem fomentos 100% dos riscos ficariam conosco e simplesmente não teríamos capacidade de fazer o projeto”, comenta o empresário.
Histórico
“No contexto da pandemia foi um alento vermos o edital do Tecnova II, da Fapeg e Finep ser lançado. Foi o que nos deu o fôlego necessário para criarmos uma solução complexa, e, portanto, arriscada, para um problema que nenhuma outra empresa havia resolvido”, descreve André. Ele conta que no início da pandemia a empresa já contava com um protótipo que já havia sido usado em outros projetos, mas não conseguia a sua venda. “O mercado simplesmente parecia que não queria resolver os inúmeros problemas de falta de coordenação na aplicação das linhas de cuidado, mas tudo mudou com a pandemia”. Ele relembra que, na época, a Federação das Unimeds de São Paulo (UNIMED-FESP), que congrega mais de 70 Unimeds do estado de São Paulo viu que a Mindify poderia os ajudar a mitigar os riscos da pandemia. “Em tempo recorde eles nos contrataram e a solução foi posta no mercado e, ao final do processo milhões de pessoas foram beneficiadas com a solução”.
Atualmente, os clientes da Mindify são hospitais, clínicas, operadoras e indústrias interessadas em promover a coordenação no cuidado em larga escala. Dentre eles estão Hospital Moinhos de Vento, Hospital das Clínicas de São Paulo (HCFMUSP), Philips e Bayer.
O que são linhas de cuidado
As linhas de cuidado são um passo a passo que as equipes médicas e os próprios pacientes devem executar para o correto diagnóstico e tratamento de doenças ou estímulo de hábitos saudáveis. “As linhas de cuidado são complexas, mas a Mindify as simplifica mostrando tanto para as equipes médicas quanto para a população quais são as tarefas a serem executas, como e quanto devem ser executadas. Com tudo isso, a qualidade assistencial aumenta e os custos operacionais caem em até 80%”, explica o empresário.
Texto: Helenice Ferreira
Fotos: Arquivo do pesquisador