Estudo busca novas alternativas para o controle de carrapatos vetores da Febre Maculosa

Os resultados do projeto financiado pela Fapeg são promissores e futuramente poderão possibilitar o desenvolvimento de tecnologias aplicadas ao controle de vetores e hospedeiros intermediários de doenças como a febre maculosa brasileira e a esquistossomose

 

Helenice Ferreira, da Assessoria de Comunicação da Fapeg

Etapas para obtenção do extrato e síntese das nanopartículas. Foto: arquivo do pesquisador

Definitivamente a nanotecnologia veio para ocupar, neste século XXI, um papel fundamental para dar maior impulso à ciência. São inúmeras as suas aplicações nas diferentes áreas do conhecimento que demandam cada vez mais da nanoescala, seja para propriedades químicas, mecânicas, magnéticas, eletrônicas e óticas.

Aliar nanotecnologia e biotecnologia significa avançar ainda mais em medicina, agricultura, meio ambiente, cosméticos etc. Nos últimos anos, a interface entre nanobiotecnologia, bioprospecção a partir de moléculas produzidas pelo metabolismo secundário de plantas e parasitologia tem contribuído para estudos de desenvolvimento de novas tecnologias para o controle de vetores e hospedeiros intermediários de agentes patogênicos de importância em saúde pública e saúde animal. A síntese de nanopartículas a partir de extratos vegetais e a busca por moléculas bioativas produzidas pelo metabolismo secundário de plantas tem sido indicada como uma estratégia que pode ser mais segura para o meio ambiente, saúde animal e humana, estando alinhada com o conceito de Saúde Única.

Neste sentido, uma equipe de pesquisadores, sob a coordenação dos professores Caio Márcio de Oliveira Monteiro e Thiago Lopes Rocha, do Instituto de Patologia Tropical e Saúde Pública (IPTSP), da Universidade Federal de Goiás (UFG), por meio do Projeto NanoMed, está investigando se as nanopartículas de prata, verdes, sintetizadas a partir do extrato foliar de Croton urucurana, planta encontrada no bioma Cerrado, possui atividade contra o caramujo Biomphalaria glabrata. Os pesquisadores investigam, ainda, a atividade repelente e acaricida do óleo essencial de outras espécies de plantas do gênero Croton e de moléculas isoladas desses óleos (eugenol e metil eugenol) sobre o carrapato-estrela, Amblyomma sculptum.

O projeto está sendo desenvolvido nos laboratórios do IPTSP/UFG (Laboratório de Biologia, Ecologia e Controle Carrapatos, e Laboratório de Biotecnologia Ambiental e Ecotoxicologia) em colaboração com os laboratórios multiusuários da UFG, e laboratório NanoSys da Faculdade da Farmácia da UFG. A pesquisa também conta com a colaboração de pesquisadores do Instituto Federal Goiano Campus Rio verde e Campus Urutaí, Universidade Estadual de Goiás e Universidade Estadual do Vale do Acaraú (CE).

O professor Caio Monteiro explica que, “o projeto visa o desenvolvimento de produtos de inovação e patentes associados ao controle de vetores e hospedeiros intermediários de doenças tropicais, bem como o desenvolvimento de estratégia de prevenção e controle de doenças infecciosas de relevância epidemiológica para o Estado de Goiás, alinhados com o conceito de ‘Saúde Única’ e Sustentabilidade”. Para ele, o apoio da Fapeg e do CNPq, por meio da Chamada Pública PPSUS, “foi fundamental para a promoção de ações que visam a formação de recursos humanos de alto nível e o desenvolvimento científico e tecnológico do Estado de Goiás, especialmente em áreas de pesquisa que visam a Saúde Única e o desenvolvimento de tecnologias mais sustentáveis”.

Carrapatos – larvas e ninfas

O professor Caio Monteiro destaca que, em relação aos testes com carrapatos, foram coletadas amostras das plantas C. virgultosus e Croton sp. Segundo ele, uma parte das amostras coletadas foi utilizada para identificação da espécie, e as exsicatas foram depositadas em uma coleção de referência. Das amostras dessas plantas foi obtido o óleo essencial. O professor explica que “nesse óleo foram caracterizados os compostos majoritários encontrados na espécie C. virgultosus: o metil eugenol e 1,8 Cineol, enquanto em Croton sp. os compostos majoritários foram o metil eugenol e eugenol”.

Amblyomma sculptum, conhecido popularmente como carrapato-estrela. Foto: arquivo do pesquisador

Caio Monteiro relata que foram realizados testes de larvas utilizando os óleos essenciais e os compostos majoritários, e todos tiveram atividade carrapaticida, contudo, ele destaca que os compostos isolados tiveram maior atividade. “Foram feitos testes combinando o metil eugenol e eugenol com timol, e foi observado que o timol potencializou a atividade carrapaticida dessas outras duas moléculas. Na análise de microscopia eletrônica de varredura, foi observado que a combinação timol + eugenol ocasionou alteração na cutícula de larvas de A. sculptum”. O professor explica que essa avaliação ainda será feita para combinação do timol com metil eugenol.

Nos testes de repelência em laboratório com ninfas, o professor destaca que foi observado que o eugenol e o metil conferem elevada repelência, acima de 80% por mais de 24 horas. Segundo ele, “agora serão realizados os experimentos de desenvolvimento de formulações e o teste de repelência em condições de campo”. As atividades de pesquisa descritas (finalizadas e em andamento) resultaram na publicação de dois artigos científicos em revistas A1 e/ou A2 no Qualis Capes. Também foi produzido um artigo de revisão com nanopartículas para controle de carrapatos que será submetido a publicação.

 

 

Testes em moluscos

Biomphalaria glabrata. Foto: arquivo do pesquisador


Para a avaliação da atividade moluscicida das nanopartículas verdes, o professor Thiago Rocha explica que as folhas da planta C. urucurana foram coletadas na cidade de Santo Antônio da Barra, GO e o extrato foliar aquoso e hidroetanólico foram obtidos. “A seguir, as nanopartículas de prata e cobre verdes foram obtidas de ambos os extratos e caracterizadas por diferentes metodologias”, relata o pesquisador, acrescentando que os resultados da síntese comprovaram que as plantas do Cerrado podem ser utilizadas na obtenção de nanopartículas verdes.

 

Em seguida, as atividades moluscicidas das nanopartículas verdes e dos extratos foram avaliadas em embriões e recém-eclodidos dos caramujos. O professor explica que, os resultados dos testes de toxicidade indicaram que ambas as nanopartículas verdes (sintetizadas com extrato aquoso e hidroetanólico da planta C. urucurana) foram mais tóxicas para embriões e caramujos recém-eclodidos em comparação com extratos foliar da planta C. urucurana. “Ambas as nanopartículas verdes induziram mortalidade, atraso na eclosão, inibição do desenvolvimento e alta frequência de embriões com alterações morfológicas”, comemora Thiago Rocha.

“Os testes de toxicidade com os caramujos adultos estão em andamento e permitirão a compreensão do mecanismo de ação das nanopartículas verdes e os extratos nos caramujos”, relata o pesquisador. Os resultados obtidos até o presente momento já foram publicados em dois artigos de revisão em revistas A1 no Qualis Capes, sendo que estão em fase de submissão dois artigos com os dados experimentais. “Os resultados são promissores e possibilitaram o desenvolvimento de nanobiotecnologias verdes aplicadas ao controle de doenças parasitárias negligenciadas, tais como a esquistossomose”, destaca Thiago Rocha.

Apoio da Fapeg

O projeto de pesquisa do professor Caio Monteiro, denominado “Nanobiotecnologia verde aplicada ao controle de vetores e hospedeiros intermediários de importância médica (Projeto NanoMed Verde)” foi um dos 20 selecionados pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) por meio da Chamada Pública 05/2020 – 7ª edição do Programa Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde. A Fapeg está investindo R$ 109.177,24 para a execução dos trabalhos de pesquisa.

Equipe

A equipe do projeto é multidisciplinar e composta por professores do IPTSP/UFG (Dr. Caio Márcio de Oliveira Monteiro, Dr. Thiago Lopes Rocha, Dr. José Clecildo Barreto Bezerra e Dra. Viviane Zeringota), Faculdade de Farmácia (Dr. Ricardo Neves Marreto e Dra. Stephania Fleury Taveira), e Instituto de Química (Dra. Emília Celma de Oliveira Lima) da UFG, pós-doutorando Bruno Bastos Gonçalves (PPGBAN/UFG) e os doutorandos Maxwell Batista Caixeta (PPGBRPH/UFG), Paula Sampaio Araújo (PPGBRPH/UFG) e Mayara Macedo Barrozo Santos (PPGCA/UFG), e da aluna de iniciação científica (Victoria Aparecida Santos de Sousa), bem como, de outros discentes de graduação e pós-graduação que fazem parte do Labec e Labae. O projeto também conta com a colaboração de professores do Instituto Federal Goiano Campus Rio Verde (Eloiza da Silva Nunes) e Urutaí (Dr. Guilherme Malafaia), da Universidade Estadual de Goiás (Dra. Luciana Damacena Silva), Universidade Estadual de Goiás e Universidade Estadual do Vale do Acaraú (Geovany Amorim Gomes).

Carrapato

Amblyomma sculptum, conhecido vulgarmente como carrapato-estrela, tem equinos, antas e capivaras como hospedeiros preferenciais, mas devido à baixa especificidade parasitária, pode ser encontrado em outros hospedeiros, incluindo humanos. Sua importância é caracterizada principalmente pelo fato de ser o vetor da bactéria Rickettsia. rickettsii, agente etiológico da febre maculosa brasileira.

A febre maculosa brasileira representa um grave problema de saúde pública, com elevada taxa de letalidade, podendo chegar a 80%.

Para o professor Caio Monteiro, o desenvolvimento dessa pesquisa pode resultar em tecnologia que ajude no controle desse carrapato, não só no estado de Goiás, como em outros locais do país também.

Caramujo

O caramujo Biomphalaria glabrata é a espécie hospedeira intermediária do Schistosoma mansoni mais importante nas Américas por apresentar altos níveis de infecção e ter sua distribuição, no Brasil, quase sempre associada à ocorrência da esquistossomose. Sua presença foi notificada em 16 estados brasileiros (Alagoas, Bahia, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, São Paulo e Sergipe), além do Distrito Federal. A esquistossomose mansoni é considerada a segunda maior doença tropical. Acomete 230 milhões de pessoas e cerca de 600 milhões de pessoas vivem em área de risco.

Para o professor Thiago, o estudo desenvolvido no estado de Goiás contribuirá com o desenvolvimento de estratégias para o controle do caramujo em todo o Brasil e outros países.

O professor Caio Monteiro ministra disciplinas para o curso de Bacharelado em Biotecnologia (Introdução ao Método Científico e Biotecnologia Aplicada a Parasitologia) e para o curso de Medicina Veterinária (Parasitologia Veterinária). É vinculado em dois programas de Pós-graduação: o Programa de Ciência Animal (EZV/UFG) e o Programa de Medicina Tropical e Saúde Pública (IPTSP/UFG), onde participa de disciplinas relacionadas à Parasitologia e Pesquisa em Bases de Dados, além de colaborar em disciplina de Controle Biológico no Programa de Pós-graduação da Escola de Agronomia.

 

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