Pesquisa investiga trabalho pedagógico com tecnologias digitais e móveis durante suspensão das aulas presenciais

O grupo disponibilizou um link para tirar dúvidas dos professores ou dar dicas sobre material didático virtual.

grupo em teletrabalho professora rosemara
Foto: Arquivo pessoal

Helenice Ferreira, da Assessoria de Comunicação da Fapeg

No dia 17 de março de 2020, quando o Conselho Estadual de Educação de Goiás publicou a Resolução 02/2020 estabelecendo o regime especial de aulas não presenciais no sistema educativo como medida preventiva à disseminação da Covid-19, os professores da educação pública se viram diante da obrigatoriedade de ensinar utilizando tecnologias digitais de informação e comunicação.

Investigar como o trabalho pedagógico com tecnologias digitais está sendo realizado na educação básica (ensino fundamental e médio) durante o período de suspensão das aulas presenciais é uma proposta de pesquisa da professora doutora Rosemara P. Lopes, da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás e professora do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade Federal de Jataí. A ideia é facilitar a compreensão dos impactos das medidas de enfrentamento à Covid-19 sobre a educação básica da rede pública de Goiás, discutir limites e apontar possibilidades e eventuais mudanças.

Segundo a pesquisadora, “os resultados deverão auxiliar a interpretar do ponto de vista científico esta experiência vivida em caráter emergencial”. Ao final, a pesquisa pretende apontar quais foram as tecnologias e mídias mais utilizadas por alunos e professores no período, quais as maiores dificuldades encontradas por professores e gestores escolares, quais os formatos das aulas ministradas, entre outras questões.

O estudo da professora Rosemara foi selecionado em uma convocação de projetos científicos promovida pelo Governo de Goiás realizada por meio de parceria entre a Fundação de Amparo à Pesquisa de Goiás (Fapeg) e a Subsecretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação, da Secretaria de Desenvolvimento e Inovação (Sedi). A convocação, que selecionou este e outros 12 trabalhos, teve como objetivo identificar projetos em todas as áreas do conhecimento que pudessem contribuir de forma relevante para reduzir os impactos da pandemia de Covid-19 e facilitar o direcionamento de esforços e de recursos para a tomada de ações estratégicas em Goiás.

professora rosemara
Foto: arquivo pessoal

A professora Rosemara Lopes é líder do Grupo de Pesquisa Tecnologias Digitais e Formação de Professores (GTDiF) que vai executar o projeto. Desde 2008 ela se dedica à pesquisa sobre a formação de professores para o uso de tecnologias digitais e trabalha com o uso dessas tecnologias em instituições públicas de ensino. “Quando foi deflagrado o isolamento social e em seguida a suspensão das aulas presenciais, enxerguei a necessidade de pôr em prática conhecimentos que nem todo professor tem e que são necessários para entender as tecnologias na educação e trabalhar com elas. O professor que tem vivenciado a pandemia e os efeitos dela sobre a educação conhece a realidade a partir de sua própria experiência, mas desconhece o todo, a pesquisa vem auxiliar nesse sentido”, ressalta a pesquisadora.

O GTDiF é composto por estudantes de pós-graduação e professores-pesquisadores, entre eles o professor doutor Eloi Feitosa, pós-doutor pelas universidades de Lund e Uppsala, Suécia, e a professora doutora Luciana Cristina Porfírio, da Universidade Federal de Jataí, líder do Grupo de Estudos Didática Ensino e Estudos Comparados em Educação (GDEEC). Para desenvolver o estudo, o grupo foi dividido em cinco equipes compostas por professores doutores, professores da rede pública de educação básica e estudantes de pós-graduação.

A pesquisa

O  grupo disponibilizou, neste mês de agosto, o link  GTDiF Responde, on-line e gratuito, criado para o atendimento de professores e gestores escolares. Por meio da ferramenta, o professor preenche o formulário com a sua dúvida e envia. A resposta é encaminhada em até 48 horas, explica Rosemara, ressaltando que “são passíveis de atendimento dúvidas de caráter pedagógico ou técnico ou ainda dicas de material didático virtual”. Será divulgado à comunidade escolar pela internet (em grupos de WhatsApp e no site https://ggtdif.wixsite.com/gtdif).

Professora Rosemara
Membros do grupo reunidos na Faculdade de Educação da UFG

A pesquisa será realizada em duas etapas. A fase documental teve início em abril e prevê atividades de levantamento e análise a serem iniciadas em agosto, com encerramento previsto entre abril e agosto de 2021. A professora explica que nesta etapa serão analisados documentos, como planos de ensino, planos de aula, relatórios de aula, planos de ação institucionais, aulas gravadas e outras formas de registro do trabalho pedagógico durante o período de suspensão das aulas presenciais para identificar as tecnologias e mídias adotadas, as principais dificuldades para ministrar aulas não presenciais, o formato dessas aulas, os conhecimentos profissionais empregados para realizá-las, entre outros aspectos. Ela esclarece que o professor ou gestor que tiver material para análise pode entrar em contato pelo e-mail gtdif.gp@gmail.com, escrevendo no assunto “Pesquisa Covid-19 GTDiF”.

A segunda fase do projeto será a pesquisa de campo, com aplicação de questionário e entrevistas com professores da rede pública municipal e estadual de Goiás, prevista para iniciar no segundo semestre de 2021.

O estudo prioriza escolas de Goiânia, Rio Verde, Jataí e Santa Helena de Goiás, por ter pesquisadores atuando nessas localidades, mas a professora Rosemara destaca que qualquer escola de ensino fundamental e médio da rede pública de Goiás pode participar como colaboradora, fornecendo documentos para análise pelo e-mail do GTDiF. Todo colaborador ou instituição colaboradora será convidado a participar de um workshop previsto para o segundo semestre de 2021, organizado para apresentar os resultados da pesquisa, que também serão divulgados em revista científica.

Por ainda estar em fase inicial, a professora Rosemara ressalta não ser possível fazer uma análise preliminar da pesquisa. “O que temos são hipóteses levantadas a partir dos resultados de um mapeamento sobre a legislação educacional brasileira desde que foram deflagradas as medidas de enfrentamento da Covid-19, combinado a outro, sobre notícias divulgadas na internet acerca da educação nesse período”, declara. Segundo ela, esse mapeamento aponta algumas tendências, por exemplo, sobre tecnologias a serem utilizadas para a promoção das aulas não presenciais, ganhando destaque as vídeo-aulas, os repositórios de objetos educacionais (material pedagógico virtual) e a televisão.

Estes mapeamentos preliminares permitem contextualizar o trabalho pedagógico em um cenário mais amplo, ressalta a professora. “Tecnologias de uso pessoal, como celular e WhatsApp, adotadas para atendimento aos alunos, vários alunos por turma, mais de uma turma por professor, colocam a necessidade de discutir aspectos normativos. Aspectos legais e éticos do trabalho pedagógico virtual são desconhecidos pela comunidade escolar”.

“Da noite para o dia, os professores passaram a ensinar somente por meio de tecnologias e muitas questões foram surgindo, além das já existentes antes da pandemia”, esclarece a pesquisadora apontando a falta de acesso a equipamentos e internet e as condições de realização do teletrabalho como algumas delas. “Em nosso dia a dia termos como ‘ensino remoto ’ foram se tornando frequentes. Logo se percebeu que ensinar e aprender em casa era diferente”, comenta.

Ela aponta que nos últimos meses, ferramentas como o Google Meet se tornaram populares e de uso diário no ensino superior e o G-Suíte desponta como possibilidade para as aulas virtuais. “Terá ocorrido o mesmo na educação básica? A pandemia criou um novo cenário na educação pública brasileira ou apenas escancarou o que já estava latente? Esperamos que este nosso estudo sobre o trabalho pedagógico durante o período de suspensão das aulas presenciais em decorrência da Covid-19 contribua para responder a essas e outras questões”.

A professora argumenta que há décadas estudos apontam a necessidade de formar professores para o uso de tecnologias, atualmente digitais e móveis, formação ainda não alcançada. “Antes da pandemia, a relação do professor com as tecnologias era marcada por faltas (de conhecimentos, de formação, de infraestrutura, de tempo, de apoio para práticas pedagógicas inovadoras, entre outras), sendo a tecnologia sempre novidade na escola”. Esse professor, até então receoso e pouco familiarizado com as tecnologias na educação passou a trabalhar exclusivamente por meio delas, analisa. “A opção de usar tecnologias para a realização de uma aula foi substituída pela obrigatoriedade. A resistência cedeu lugar à necessidade. O vazio das aulas presenciais foi preenchido por computador, celular e internet.”

“O meio mudou, passando do presencial ao virtual, mas o professor continuou o mesmo. Também os alunos, apesar de conhecerem a tecnologia melhor do que os seus professores e as utilizarem largamente fora da escola, podem reagir negativamente a mudanças no modo de ensinar e aprender”, comenta a professora. Neste cenário, ela questiona: “será positiva esta experiência educacional durante a pandemia? O futuro aponta para uma reconfiguração do trabalho docente ou ela já está em andamento? Acreditamos que os esforços de pesquisadores, professores e gestores possam contribuir para mudar essa realidade”.

A professora Rosemara declara que o apoio da Fapeg é fundamental para a realização da pesquisa, que segundo ela será desenvolvida por meios digitais (internet e plataformas virtuais), eliminando alguns custos. Financeiramente, os recursos concedidos pela Fapeg incluem bolsa, serviços, material de consumo, despesas com locomoção e diárias. “A aprovação de um projeto de pesquisa voltado a investigar o impacto das medidas de enfrentamento da Covid-19 sobre a educação é um incentivo a outros pesquisadores. Mostra o reconhecimento de que também a educação é afetada pelos efeitos da pandemia e pesquisas nessa área são necessárias”.

A professora pesquisadora Rosemara Lopes é doutora em Educação pela Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

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