Procurador do Estado fala sobre decisão do STF acerca das parcerias do Poder Público com OSs


STF: É constitucional o modelo de parcerias!

Depois de quase 17 anos, o Supremo Tribunal Federal (STF), finalmente, concluiu, no último dia 16 de abril, o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 1923, que questionava a validade da Lei federal nº 9.637/98, relativamente à celebração de contratos de gestão pela União com organizações sociais (OSs) para a execução de tarefas públicas nas mais variadas áreas (saúde, educação, cultura etc.).
Por maioria, o Plenário do STF reconheceu ser constitucional o modelo de gestão da coisa pública que tem em causa a transferência da execução de certas atividades de relevância social, a partir de vínculos de parceria celebrados pela Administração Pública com organizações sociais. Com tal entendimento, extrai-se que, para o STF, a maior ou menor participação direta do Poder Público na prestação de serviços públicos ou de relevância pública é algo que depende, essencialmente, do programa político e da opinião política das maiorias conjunturalmente no poder, já que, nos termos da Constituição, não havendo monopólio estatal na ofertas de certos serviços sociais, a sua execução, por meio de mecanismos de fomento público (repasse de recursos e cessão de bens e de servidores públicos), pode ser validamente cometida a privados.
Ao chegar a tal resultado, a Corte máxima do país, inescapavelmente, assenta que o ritmo das Administrações Públicas, marcadas transversalmente pelo detalhismo, formalismo e processualismo, é por tudo diferente do ritmo da sociedade, sempre exigente de serviços públicos de mais e melhor qualidade, com prestação eficiente e expedita. Não sendo viável um regresso ao estatismo de outrora, em que um Estado grande e musculado tudo provê de forma direta, o deslinde do julgamento da ADI nº 1923 é, à evidência, um grande e significativo divisor de águas no recôncavo dos mais diversos entes federativos, sejam eles grandes ou pequenos, pobres ou ricos, por reconhecer que diversas formas organizatórias podem compor o desenho da Administração Pública contemporânea.
No entanto, para além de conferir segurança e certeza jurídicas a gestores governamentais e decisores políticos no que diz respeito à celebração de parcerias com organizações sociais, o resultado obtido pelo STF contribui sobremaneira para, de uma vez por todas, espancar todas as resistências e ruídos de ordem ideológica que, de maneira injurídica, sempre contaminaram o discurso e o aprofundamento dos vínculos de parceria do Poder Público com as entidades privadas. Por outras palavras, se o fenômeno em causa é tido como “terceirização”, “privatização”, “desmonte do Estado” ou coisa semelhante, o fato é que, pouco importando o tom semântico conferido às expressões que designam tal forma de administrar, o que se tem, ao cabo e ao resto, não é mais que o reconhecimento, pela mais alta Corte de Justiça do país, de que as parcerias concretizam novos papeis do Estado e, por conseguinte, novas funções para a Administração Pública.
Afastado, portanto, encontra-se o risco da alquimia inversa: a participação do setor privado na prestação de serviços de relevância pública, por si só, não tem mais o condão de mineralizar aquilo que toca, a converter o ouro em carbono. Em resumo: tarefas sociais podem validamente, com apoio na Constituição Federal, ser executadas por privados, em parceria com o Poder Público. Superado tal tema, é necessário agora avançar nos mecanismos de controle, fiscalização e regulação. É isso o que realmente importa!

Rafael Arruda. Mestre em Ciências Jurídico-Econômicas pela Universidade de Lisboa (Portugal). Procurador do Estado (Casa Civil). Professor-convidado da Faculdade de Direito da UFG. Advogado.

 

* versão deste texto foi publicada no Jornal O Popular do dia 28/04/2015.

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