#TBT da ABC | Os desafios da longa jornada: idosos e “melhor idade”
Em sociedades antigas, eles eram guardiões da história e da memória. Hoje eles podem estar nos seus melhores dias de consumo ou ter desafios diários para proteger-se dos maus-tratos.
Durante muito tempo, ser idoso comportava uma série de valores e sentidos que os faziam ser celebrados pela sociedade, fossem por sua vivência, pela sabedoria ou pela memória que detinham. Não era uma relação fácil, pois a média de vida em diversos lugares do mundo e em vários momentos da história fazia com que chegar numa idade avançada fosse algo distinto. Mesmo que não fosse raríssimo superar os 50 ou 60 anos durante a Idade Média ou no Brasil colônia, sobreviver às doenças, às guerras, às perseguições, à fome e a outros eventos que dizimavam milhares de pessoas fazia uma espécie de "seleção" onde muitos ficavam nas primeiras etapas da vida. Foi o controle das taxas de mortalidade infantil e de jovens que facilitou que maiores contingentes tivessem longevidade ampliada, aumentando assim a média de vida das comunidades como um todo e possibilitando o aumento do número de idosos.
As transformações técnicas e sociais que ocorreram nos últimos 300 anos também causaram uma reviravolta na valorização do velho e do novo, especialmente com o fortalecimento da ideia de “modernidade” como algo sempre atual e novo. E nisso, aqueles que iam se afastando desse ideal tendiam a serem esquecidos, expostos como inadequados diante dos desejos dessa sociedade que valoriza o novo.
Os asilos durante muito tempo foram a solução dada pela sociedade e pelo poder público para lidar com o sofrimento daqueles que chegavam sem amparo nos anos finais de sua vida. Com o objetivo de oferecer apoio material e muitas vezes também espiritual, idosos, pobres, esquecidos e doentes eram recolhidos a essas instituições que por vezes serviam como modo de “apagar dos olhos da coletividade” os problemas que esses indivíduos sofriam ao invés de resolvê-los de fato. Em Goiás, o asilo “São Vicente de Paulo” pode ser apontado com um exemplo das diversas faces do auxílio aos desvalidos da comunidade. Fundado em 1909, era a maior construção da cidade de Goiás, então capital do estado e recebeu todo tipo de necessitado, de doentes com hanseníase até doentes mentais, além de pobre e idosos em geral, e é gerenciada ainda hoje por religiosos.
O perfil populacional do Brasil nas últimas décadas vem modificando-se, tendo um aumento perceptível da população idosa. Tal mudança muitas vezes não foi acompanhada por adaptações nas estruturas das cidades e dos serviços de saúde, educação, previdência ou segurança. Para tentar sensibilizar a sociedade nesse sentido, no ano de 1999 foi instituído o “Dia Nacional do Idoso”, pelo Senado Nacional, que deveria ser celebrado sempre no dia 27 de setembro. Essa discussão não se restringia ao Brasil, sendo que a ONU, e nesse mesmo ano, continuou discussões de anos anteriores e desenvolveu campanhas celebrando o “Ano Internacional do Idoso”, assim como definiu o dia 1º de outubro para atividades do “Dia Mundial do Idoso” para discutir o envelhecimento da população mundial e os desafios que isso envolve para países em desenvolvimento, como o Brasil, Índia, China e países do continente africano e nos países centrais, como EUA e do bloco europeu.
No Brasil, as discussões oriundas da repercussão de casos de violência contra idosos noticiados pela imprensa nos anos 2000 e amplificados até mesmo em telenovelas reforçaram o empenho da sociedade civil na promulgação de leis que pudessem proteger essa parcela da população. Foi nesse cenário que foi em 1° de outubro de 2003 foi publicada a lei 10.741, que ficou conhecida como Estatuto do Idoso. Essa lei aumentava a atenção do Estado em relação aos idosos, qualificando e determinando punições para aqueles que fossem condenados por maus-tratos, abandono, fraude ou violência contra maiores de 65 anos.
Atualmente, o idoso tem voltado a ser observado com mais atenção, tornando-se um público atraente especialmente para o comércio e para o setor de serviços, que têm buscado substituir a imagem da velhice sedentária e do idoso adoentado, recolhido em casa ou saudoso dos tempos de outrora por indivíduos na melhor idade, ativos e consumidores. Mas ainda hoje, depois de 17 anos, muitos são os desafios tanto para aqueles que envelheceram quanto para a sociedade que os abriga.
Givaldo Corcinio – ABC Digital