O nhenhenhém do metrô.


Inaugurado o debate eleitoral, com ele chegam os vendedores de ideias espetaculares, que no entendimento do urbanista Jaime Lerner (Blog Porto Imagem, 12/12/2009) justifica a tendência do nosso jeito subdesenvolvido de lidar com problemas tão graves, como o são a mobilidade urbana e suas decorrências sociais, econômicas e urbanísticas.

Nesse figurino é que se encaixa a solução metroviária apresentada pelo presidenciável José Serra como resposta aos problemas do transporte público da Região Metropolitana de Goiânia (RMG) – O POPULAR, quarta-feira. Além de risível, pelo histórico, são esses equívocos que conduzem os gestores públicos a encontrar na obsolescência, com a contumácia de sempre, a última e mais eficiente novidade – a solução tabajara que infelizmente mantém a inspiração obreira de muitos deles.

O que nos constrange, no entanto, não é a promessa propriamente dita, mas o que ela encerra de contradições e demagogia. É obviedade técnica que solução sob trilhos merece atenção adequada, seja por se tratar de tecnologia onerosa, seja pelo contexto logístico no qual esteja inserida – dois dos fatores a caracterizar esta solução como atualmente inadequada para a Região Metropolitana de Goiânia.

Uma das contradições que nos permitem a preocupação possui natureza conceitual, porque Goiânia e sua mancha metropolitana ainda carecem de identidade no âmbito das suas políticas de mobilidade. Exemplo disso está nos constantes conflitos entre o transporte público e o individual, sobretudo quando qualquer previsível iniciativa é implantada em favor do primeiro. A cultura de viadutos e a fragmentação de praças e canteiros traduzem outro grave vício conceitual, porque corroboram contra a equidade do uso dos espaços públicos, aumentando progressivamente os custos das cidades.

Do ponto de vista técnico é ainda mais visível o equívoco, mesmo sendo a promessa o metrô leve sobre trilhos. Se ainda não conseguimos esgotar a capacidade do sistema sobre rodas, tampouco desprivatizar a sua gestão, e muito menos implantar novos corredores exclusivos com a ampliação dos existentes para se lhes aumentar a velocidade comercial, como investir numa tecnologia que para dar certo exige todos estes requisitos básicos para funcionar com eficiência, de forma integrada a outros modais (inclusive os não motorizados) e em rede?

Mas o candidato do metrô também contribui com uma dica semântica, pois ao alegar que Goiânia “não é grande como São Paulo e Rio”, educadamente nos confirma que a melhor tecnologia para o nosso tecido urbano é outra, de custo mais acessível, menos complexa e já experimentada em várias cidades brasileiras: os BRT (Bus Rapid Transit), sigla que designa o sistema sobre rodas em superfície canalizada e exclusiva. Tanto pelas peculiaridades de nossa urbe, quanto pela efetiva capacidade que detemos.

Serra conhece o exemplo metroviário de São Paulo por dois distintos ângulos, pois atuou na sua administração como prefeito e governador por cinco anos seguidos (2005-2010). Sabe que a rede de bilhões de reais transporta apenas 16% dos usuários totalizados contra os demais que se deslocam na superfície, não raro competindo sobre os mesmos espaços físicos.

Sabe também que nas suas administrações, o metrô decresceu oito pontos na prestigiada Pesquisa de Imagem dos Transportes na Região Metropolitana de São Paulo (Portal ANTP Weblioteca) – o que implica dizer que este novo nhenhenhém chega desacreditado por aqui, a permear uma cidade que não pode mais inverter as suas prioridades para o setor.

Antenor Pinheiro é jornalista, presidente do Conselho Estadual de Trânsito de Goiás (Cetran), ex-membro titular do Conselho Diretor da Associação Nacional de Transportes Públicos/ANTP – perito@antenorpinheiro.com

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